Com vontade de escrever III – extraindo as palavras dos veios
já quase esgotados.
Em arrazoados anteriores, tratou-se, despretensiosamente, de
discorrer acerca de pandemias que vez por outra assolam grande parte das sociedades,
desde quando os seres humanos sulcam a
terra no intento de produzir víveres necessários à subsistência ao se tornar sedentários
e/ou ainda quando eram nômades e vagueavam pela terra caçando, coletando e
pescando para garantir a vida contra a fome, o frio e demais intempéries a que
estavam sujeitos. Também foi dito que o continente ocupado pelos europeus a
partir do final do século XV, experimentou uma avalanche de epidemias, que teve
como um dos resultados uma gravíssima redução populacional da qual nunca se
recuperou – considerando-se a população nativa do continente -, tendo sido a
varíola a mais grave e letal delas.
Crê-se ser hora de arrematar o tema, visto que este escrevedor
não tem domínio dele, bastando se contentar com elaborações desprovidas de
assertivas definitivas, por não ser um pesquisador cujo objeto seja o que aqui
se chamaria de “História das doenças”; Por tanto, por escrever tão somente na
condição de professor de “História da América” há já algum tempo, cujas bases
são as muitas leituras já feitas para o labor da sala de aulas, é preciso então
concluir.
Como já foi dito, a virulência de tais agentes patogênicos
sobre a população nativa que habitava o “Novo Mundo” quando os europeus o “encontram”
entre os dois Oceanos, se explica, em
geral, pelo fato de não haver imunidade aos vírus que também eram “novos” para os
seus sistemas imunológicos, devido à inexistência de contatos humanos
anteriores a um período de ao menos 10 mil anos entre os que habitavam de um
lado e do outro do Oceano Atlântico.
Alguns autores chegaram a postular a possibilidade de tratar-se
de uma espécie de “protótipo” de “Guerra” bacteriológica. É difícil sustentar
tal postulado, salvo a existência de estudos satisfatoriamente desenvolvidos
com bases sólidas de apoio documental, uma vez que não poderia haver uma “contaminação”
ardilosamente arquitetada, visto os europeus sequer suspeitarem da existência
de outro lugar que não fossem aqueles já bastante conhecidos: os situados no
bloco continental convencionalmente chamado de “velho Mundo”.
Mesmo quando já havia o interesse pela ocupação, conquista e
exploração das “novas” terras “descobertas”, não fica claro que os europeus
pretendiam quebrar as resistências dos nativos, mediante a sua eliminação pura
e simples.
Se assim procedessem, quem lhes faria o trabalho de
prospecção de metais preciosos, tão necessários ao processo de “acumulação
primitiva de capital”, que em última análise, era a motivação maior daqueles
homens deixarem toda uma vida já de algum modo solidificada na Europa, para arriscar
tudo, inclusive a vida no “novo “continente ?
E, ainda quando a prata e o ouro não mais era o móvel
impulsionador da colonização, não fazia sentido uma dizimação populacional,
deliberadamente urdida pelos exploradores, sob pena de perder – como ocorreu em
alguns casos – os braços que amanhariam e cultivariam a terra para eles.
As centúrias que se seguiram à chegada de Colombo ao Caribe,
são marcadas por várias ondas das doenças inicialmente desencadeadas pelo aportar de homens, mercadorias,
animais e vírus nos diversos lugares do continente, intercalados por surtos,
mais ou menos letais; também as doenças locais tiveram grande participação nas
ondas de mortes que provocaram debacles demográficas consideráveis, dificultando
a plausibilidade de ter havido uma “guerra bacteriológica” no curso do processo
de ocupação, colonização e exploração das novas terras, uma vez que aquilo
tornaria difícil e dispendiosa a substituição de braços, ainda que tais fossem
importados do continente africano, o que, saliente-se, não era barato ou
rentável.
Cabe ainda considerar que os patogênicos locais, de alguma
forma já conhecidos pelo sistema imunológico dos nativos da Terra ameríndia, foram
avassaladoramente letais aos homens que se lançaram na “empresa” agro
colonizadora, bem como naqueles outros cujo impulso fora a mineração em um
primeiro momento e, após o esgotamento de lavras e/ou dos meios de as alcançar
em profundidades maiores, se dedicaram ao extrativismo de produtos exóticos
para a exportação.
Assim, tendo em vista a falta de anticorpos para os vírus e
bactérias existentes nos trópicos americanos, fizeram com que inúmeros europeus
fossem sepultados no lugar de onde pretendiam voltar ricos; que alguns deles
tivessem membros parcial ou totalmente gangrenados pelos “bichos de pé” e
demais tipos de fungos extremamente agressivos; que ainda outros muitos levaram
para o velho continente doenças lá ainda não existentes, provocando grande
número de contaminações e mortes.
Professor Jorge Damasceno
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