terça-feira, 30 de março de 2021

Idos de 1991 -Histórias e Memórias de um Estágio que não terminou.

 

Idos de 1991 – trinta anos de um estágio que não terminou

 

Era uma segunda feira e, logo cedo, este escrevedor se dirigiu ao centro da cidade, com o intuito de comprar material de apoio para o seu estágio supervisionado, como cumprimento da última etapa para a conclusão do curso de Licenciatura em História, que já se arrastava à longos cinco anos.

Ao entrar em uma das papelarias, iniciara o seu atendimento uma jovem que comentava um fato que iria marcar a sua memória: dizia a vendedora, que ouvira falar de um acidente que interrompia a vida e a carreira de Gonzaguinha, um dos marcos musicais de uma juventude ainda interessada em boas canções.

Aquela informação fora impactante demais para ser esquecida. Sempre que este escrevedor é remetido àquele momento de sua vida acadêmica, relaciona imediatamente estes dois elementos, a partir dos quais desenvolve o seu rememorar do tão esperado quanto temido dia em que enfrentaria pela primeira vez uma turma de verdade: o estágio.

De posse do material com o qual confeccionaria alguns elementos de apoio às suas aulas, como mapas e quadros esquemáticos, o estagiário voltou para casa em busca do seu inseparável receptor de rádio, a fim de confirmar o que ouvira na loja. Era verdade: Gonzaguinha fora vítima de acidente automobilístico que lhe fora fatal.

É verdade que aquele estagiário pouco conhecia da obra de Gonzaguinha, salvo algumas clássicas e uma antológica que cantava juntamente com o seu pai adotivo, o velho “rei do baião”, aliás, falecido quase dois anos antes. Era “Vida de viajante”, cujo link segue abaixo.

https://youtu.be/hh5BMG69WVI

Mas, o que talvez lhe tenha chamado a atenção, fôra as circunstâncias trágicas daquela morte, em idade tão precoce – Gonzaguinha contava 45 anos (setembro de 1945, abril de 1991) -, bem como a aludida proximidade da morte do quase octogenário Luís Gonzaga.

Mas, voltando ao estágio, dali há alguns dias, depois de ter contado com alguns mapas pertencentes à biblioteca da FFPa e, de contar com o inestimável apoio de Marcos, que com a sua grande habilidade serigráfica, interpretou em quadros esquemáticos as confusas ideias do atemorizado estagiário, tem início as aulas em uma turma do primeiro ano de desenho arquitetônico, aliás, turma cuidadosamente escolhida, no matutino do Centro Integrado Luiz Navarro de Brito – o bem conhecido Estadual -, onde aquele estagiário estudara grande parte de sua vida, espaço que lhe era muitíssimo bem conhecido, o que facilitaria o seu ir e vir, no período que o estágio duraria.

Depois de breve apresentação feita pela professora responsável pela turma, com algum receio, começou enfim aquela atividade que fôra o teste de fogo para este escrevente, visto que, àquela altura, prestes a concluir a Licenciatura em História, jamais entrara em uma sala de aula, para o exercício docente, o que para os demais colegas, inclusive os de semestres menos avançados, era lugar comum.

Um episódio que marcou aquela experiência, foi preconizado por um aluno que o procurara em sua carteira de professor, com o objetivo de dirimir uma dúvida que o assaltara. Perguntou o aluno ao estagiário: “professor, o que é estauto”?

Tendo ouvido o questionamento, percorreu lhe um calafrio, pois a dúvida do aluno estava relacionada a um texto que fora dactilografada pelas funcionárias da “mecanografia” da FFPA, famosas pelos seus erros de datilografia, desde os primeiros semestres cursados pela primeira turma, que ingressara em 1986.

Recobrado do susto, tendo procurado manter a calma, o estagiário pergunta: “meu filho, onde você leu isto”?

- Aqui, professor, no texto: “estauto político da colônia”.

Sem ter qualquer possibilidade de conferir o modo como estava escrito no texto, pediu-se ao aluno que lesse todo o trecho em que ele encontrara a dúvida. Ele foi até a sua carteira, pegou o texto e voltou para ler:

- “Estauto político ...ôh, é estatuto, professor...”

Ufa! Que alívio; não fora a dactilógrafa quem errara, fora o aluno que lera mal!

Tratava-se de uma obra clássica de Caio Prado Júnior, intitulada “Evolução política do Brasil”, de onde se retirou o capítulo “O sentido da colonização”.

Exceto este incidente indicativo da má formação escolar     do aluno, todo o estágio transcorreu com alguma normalidade, tendo até alguns momentos de empatia entre estagiário e alunos.

No entanto, logo após a primeira avaliação feita para aferir o que fora aprendido pela turma e, claro, o êxito do aprendiz de professor em sua tarefa de “ensinar”, eclodiu uma greve de professores, que, ao terminar, inviabilizou a conclusão do estágio, deixando um certo gosto de frustração, visto que o teste a que era submetido o estagiário, não foi levado até ao seu final.

Alagoinhas 30 de março de 2021.

Professor José Jorge Andrade Damasceno

segunda-feira, 22 de março de 2021

Idos de 1996

 

Idos de 1996 - Vinte e cinco anos de docência na Uneb.

 

Era uma manhã de sol de outono, daquele ano da Graça de 1996. Logo cedo, este escrevente tomou o seu café e, se preparou para cumprir um compromisso que ansiosamente esperara por alguns longos, ou, porque não dizer, quase intermináveis meses. Há cerca de quarenta dias, depois de mobilizar algumas pessoas para esquadrinhar o Diário Oficial do Estado, saíra a convocação para que se apresentasse munido de documentação e laudos médicos, para que se desse início ao processo de sua contratação, em cumprimento de sua aprovação em concurso público.

Assim, não sem alguma apreensão, deixara a sua casa e se dirigira até a rodoviária de Alagoinhas, urbe de sua moradia, com o objetivo de se deslocar até a cidade de salvador, para lá iniciar as tratativas junto ao Governo do Estado, atendendo a aludida convocação.

Ao chegar no Cab, se apresentara como tendo sido aprovado em concurso e convocado através do Diário Oficial do Estado para comparecer àquela unidade administrativa, de posse da documentação exigida, com o fito de atender aos requisitos admissionais para o cargo que fizera jus.

Ali começara um périplo que durara todo o dia, uma vez que a médica que o examinara, juntamente com a documentação apresentada, achou por bem exigir que outros laudos lhe fossem entregues, para que pudesse estabelecer o seu juízo a respeito do caso.

Um atestado comprobatório de cegueira e um eletrocardiograma foi suplementarmente pedido, o que obrigou o candidato a se dirigir ao hospital Aliança e, muito bem atendido pelo oftalmologista, dirigiu-se ao Centro Médico e Odontológico do antigo IAPSEB, nas proximidades do Centro Empresarial Iguatemi. Lá contou com a benevolência de funcionários e médicos, o que lhe permitiu não só a realização do exame, como a obtenção do laudo pouco antes do horário de almoço.

Enfim, de posse dos novos laudos exigidos, volta-se ao Cab e lá uma espera que parecera não ter fim, se conclui por volta das dezessete horas, sendo atestado apto para o ingresso no serviço público.

Chegara no setor administrativo da Uneb por volta das dezoito e trinta, após uma longa espera de ônibus que tivesse o cabula como destino; após um trajeto marcado por retenções no trânsito. Ao chegar nas salas onde funcionava o RH, quase não fora atendido, pois, apesar de ainda estar no horário de serviço, a funcionária já se encontrava de bolsa ao ombro, dirigindo-se à saída do setor. Depois de muito argumentar, ela resolveu atender ao candidato, chegado do interior, que teria grande despesa e desgastes caso precisasse voltar no dia seguinte para concluir o processo admissional iniciado no Cab.

Enfim, depois de alguns concursos sem êxito; depois de aguardar quase um ano para ser convocado mediante o concurso exitoso de 1995, em 20 de março de 1996, quarta feira, por volta das dezenove e trinta horas, depois de um dia inteiro de idas e vindas, este relator assinava a documentação que lhe propiciava a admissão nos quadros da Universidade do Estado da Bahia, para o exercício docente na ainda Faculdade de Formação de Professores de alagoinhas, no departamento de Ciências Humanas, no colegiado de História.

 

alguns dias depois, assumia o encargo de ensinar História da américa, o que ainda hoje faz, embora tendo precisado realizar um grande esforço intelectual e um grande investimento em bibliografia, para que pudesse desenvolver a tarefa com alguma qualidade, visto não ser ele pesquisador da área, o que, aliás, seria muitíssimo relevante para a sua carreira acadêmica e para a sua docência.

Aqui cabe uma menção especial ao papel desempenhado pela professora Lina Maria brandão aras, na medida em que foi a pessoa que acolheu a este garatujador; que forneceu dicas de como ele poderia montar o programa de américa II que lhe caberia ministrar; que lhe instruiu no tocante à bibliografia e, até mesmo, passou materiais com os quais se pôde trabalhar naquele iniciar de caminhada. Portanto, vale explicitar a imensa dívida que se tem para com a Professora Doutora Lina Maria Brandão Aras que, mesmo em meio às suas muitas ocupações pessoais e acadêmicas, recebeu este escrevedor em sua residência para estimular, encorajar e orientar aquele atabalhoado e assustado marinheiro que estava prestes a começar a sua primeira viagem na condição de docente do ensino superior.

vai aqui a gratidão deste escrevinhador, ao Deus Eterno que lhe propiciou iniciar e prosseguir neste labor constante; vai aqui o agradecimento e caloroso abraço a todos os alunos que, desde aquela data, passaram pelas mãos desde hoje já sexagenário professor, exigente, chato, insuportável, intragável, rigoroso, dependendo o modo como este ou aquele aluno o avaliara, por todos estes vinte e cinco anos.

Não se pode deixar de reconhecer que com um bom número de alunos se construiu bons laços de amizade, de cooperação, de troca de experiências, tanto de vida, quanto de aprendizado, a partir de leituras em comum, de boas e frutuosas conversas presenciais, através de ferramentas de trocas de mensagens ou, longas chamadas telefônicas; outros tantos, certamente cresceram e amadureceram intelectual e pessoalmente, ao aprenderem com este e com os demais professores pelos quais passaram. É gratificante a possibilidade de ter influenciado, de alguma maneira na vida e na carreira de alguns, poucos, é certo, mas, não se crê que tenha passado em branco na vida de diversos profissionais que hoje atuam no ensino fundamental ou médio, em escolas públicas ou privadas.

Enfim: toda gratidão Ao Deus eterno, o doador da vida e pleno em Graça, abundante em misericórdia, de onde se tirou forças para começar, para continuar, para prosseguir até aqui; é grande o contentamento por ter tido todos vocês como alunos.