Um escrevedor volta a falar de memória musical – IX: o
começo da caminhada – primeiro semestre de 1980 – A Primeira Igreja Batista de
Alagoinhas e as primeiras músicas evangélicas – Parte II.
Ao retomar o rememorar do começo da caminhada cristã, este escrevente
prossegue falando dos primeiros contatos que tivera com a música evangélica,
desta vez, considerando aquelas que ouvira pela primeira vez, por meio dos
“solos”, bem como fará referência a outros momentos de sua trajetória na
Primeira Igreja Batista de Alagoinhas, nos quais a música fora o elemento
desencadeador.
O “solo” era um dos elementos constitutivos da liturgia,
geralmente, nas celebrações que transcorriam aos domingos – manhã e noite -,
quando algumas pessoas tinham
participação individual no
desenvolvimento das atividades melódicas, entre os cantos congregacionais e as
leituras responsivas e, por vezes, as declamações. Aquela participação era
previamente incorporada a ordem de culto, mediante convite e/ou inscrição da
pessoa interessada em fazer parte daquele momento solene. O solista, por sua vez, escolhia o hino que seria cantado
e, dependendo do caso, seria acompanhado pelos musicistas, pelo próprio solista
ao violão ou, em solo “a capela”.
Este narrador lembra perfeitamente que a professora Maria
Rita Borges e a irmã Isauri, eram aquelas que mais apresentavam os seus “solos”
no formato “a capela”. Abaixo, duas das músicas que elas gostavam de cantar nas
manhãs de domingo, na referida modalidade de interpretação musical.
Tem-se bem claro que “Junto a Jesus”, era magnificamente
interpretado por Maria Rita Borges, provavelmente, a partir da audição de Feliciano
Amaral, (1920-2018)–
É igualmente claro no rememorar deste escriba, os solos da
mesma Maria Rita Borges, do hino “Lindo País”, inserido no mesmo disco de
Feliciano Amaral, em que se encontra o hino anterior.
Quanto a quem escreve estas linhas, um sujeito sempre
apaixonado pela música, interessado em conhecer o mundo melódico construído,
alimentado e alimentador do gosto musical do protestante em geral e do Batista
em particular, estabelece os seus primeiros contatos com o tal mundo, a partir
daquilo que se denominaria, talvez não muito adequadamente de “escola” de
letristas como Edson Fernandes Coelho (1947-), Sérgio Pimenta (1954-1987), Jorge
Camargo, Jorge Redher (1956-2009), Guilherme Kerr, Nelson Bomílcar, Edilson
Botelho, Armando Filho, entre outros – cumpre salientar de passagem, que no
momento aqui rememorado, este autor não tinha qualquer informação das
atividades desenvolvidas por grande parte dos nomes citados, visto que os meios
de informação eram bastante escassos e restritos à literatura especializada, à
qual ele não tinha acesso -; de grupos como Vencedores por Cristo (fundado em
1968), Logos (1981), Elo (1974-1981), Som Maior (1976), e mais um outro tanto
deles; e, naquele primeiro momento, principalmente o contato era com os
trabalhos de intérpretes como Luiz de Carvalho (1925-2015), Feliciano Amaral
(1920-2018), Denise Cardoso, Guiomar Victor, Elines, Jorge Araújo, entre tantos
outros, que ouvia e, até arriscava cantar.
Neste sentido, uma das primeiras músicas que chamou a sua
atenção e se tornou sempre presente nos
seus solfejares e assobiares, foi o hino cantado por Luiz de Carvalho, gravado
no Long-play “Alvo Mais que a Neve” e lançado em 1978, cujo título
apresentava-se para aquele momento, como se fora uma oração feita com vontade
de ver respondida: Se Jesus Voltasse agora. É claro que a vontade ali manifesta
e endossada por aquele rapaz novo na fé, tinha um que de receio de sucumbir com
o passar do tempo e, talvez para tentar escapar de tal risco, pedisse e
esperasse mesmo que “Jesus Voltasse” naquela hora, chamada “agora”.
Outras duas interpretações de Luiz de Carvalho, gravadas em
um disco mais pretérito também faziam parte da construção do novo repertório
deste garatujador. Trata-se de –
Tocou-me
E, “Quando Jesus Estendeu Sua Mão Para Mim”, inseridos no
Long-Play intitulado “Obra Santa”, gravado em 1969.
Já se disse em outro arrazoado, que o pastor Jessé, com
atitudes simples direcionadas a promover integração e/ou inserção do novo na fé
nas atividades da Igreja que pastoreava, fora fundamental para o
desenvolvimento deste que agora rememora aqueles dias, na medida em que muitas
vezes, como um pastor de ovelhas, dirigiu-se até o fundo do vale e, trouxe
aquela ovelha ainda tenra para junto de si, para melhor cuidar e alimentar.
Quiçá assim pensando, um certo dia, talvez já pelo mês de
março, ele atribuiu àquele rapaz, a tarefa de “cantar um solo” na manhã do
domingo seguinte ao aviso. E mais: indicou como sugestão para o dito solo, uma
música um tanto controversa, visto que este garatujador a conhecia em uma
interpretação de Altemar Dutra. Nem é preciso dizer que se deu o primeiro de muitos
outros nós no cérebro do rapaz. No entanto, o pastor lhe disse que era um hino
cantado por Edgar Martins e, dera-lhe o disco para ouvir e extrair a música
indicada para o solo, que levara a efeito, acompanhando-se ao violão, errando
quase tudo no concernente aos acordes, mas, cumprindo a tarefa de que fora
incumbido.
Mais adiante, o pastor Jessé fez outro gesto na direção de
envolver aquela sua ovelha tímida e retraída, nas atividades da igreja que
liderava. Aos domingos, a Rádio Emissora de Alagoinhas abria espaço para que a
Primeira Igreja Batista de Alagoinhas pudesse
difundir o Evangelho para além do seu espaço de culto, na medida em que
disponibilizava meia hora de sua programação para aquele fim. Com criatividade e
desenvoltura, o pastor Jessé apresentava o programa “boas novas”, utilizando como
prefixo musical o hino “Desperta Brasil”, cantado por Luiz de Carvalho, em
gravação de 1978. Algum tempo depois, este narrador ouviria aquele hino como
abertura do programa “A Voz do Brasil Para Cristo”, transmitido pela rádio Tupi
de São Paulo, ouvido pelas ondas curtas, levado ao ar entre dez e meio-dia,
apresentado pelo missionário Manuel de Mello (1929-1990).
Foi assim que, mediante o convite daquele prelado, este
escrevente tivera a oportunidade de participar daquele programa, cantando ao
violão. Embora conhecesse bem o prédio e os estúdios da emissora através da
qual o programa era levado ao ar, neles já tendo estado várias vezes, com
vários de seus locutores, fora o apresentador de “Boas Novas” que dera a
primeira chance de estar ali como parte efetiva daquela transmissão
radiofônica. No entanto, não ficou na sua memória, nenhum vestígio que aponte
para a música que foi cantada na ocasião. Porém, há uma memória bem viva de ter
cantado em alguma noite de domingo, uma música que ouvira algumas vezes no
rádio e conseguira gravar os seus versos e acordes , talvez, dada a simplicidade de sua construção melódica, não obstante a sua profundidade
teológica, na medida em que afirmava a ação do Deus Eterno no processo de criação
do mundo e tudo que nele há, conforme assevera o ensino bíblico. Em um magnífico poema, Edson Coelho
sintetiza esta profissão de fé e, Telma Coelho interpreta com maestria e
talento, uma das músicas de construção filosófica mais profunda e de melodia
tão bem harmonizada. O hino se intitula “Maior que tu, não há ninguém”.
José Jorge Andrade Damasceno – historiadorbaiano@gmail.com
30 de setembro de 2021.