domingo, 14 de agosto de 2022

Minha crítica ao "dia dos Pais".

Eu não gosto do dia dos pais.

 

Todas as vezes que se abre o facebook, o abestado pergunta: “no que você está pensando”? Quase sempre, eu tenho ignorado pergunta tão invasiva. Mas, hoje, eu queria dar uma resposta com um textão; o arrazoado com umas quinhentas páginas; um tratado histórico, filosófico e sociológico sobre esta idiotia social chamada “Dia dos Pais – ou mesmo das mães, ou dias de quaisquer bestices que sirvam para o incremento do comércio e das atividades litúrgico-sociais das igrejas.

No entanto, por me faltar competência para tanto e, sobretudo, por ter como certo que o tal tratado não seria lido nas tais “redes sociais”, me contentarei se conseguir escrever ao menos algumas linhas sobre esta efeméride inútil, insossa, ineficaz e inodora e, portanto, desnecessária.

Se acreditam que estou errado, ou mesmo exagerando por ter um completo desprezo por este e outros “dias”, me responda então: há pais que “merecem” e outros que não “merecem” o tal “dia”?

De pronto, eu respondo que não.

E, por que não? Perguntariam alguns.

E eu respondo: por não se viver em uma sociedade meritocrática, não é possível dizer-se que há “pais” e “pais”.

Todos são pais: os que dão presentes; os que dão a ausência como presentes; os que matam os filhos de outros pais, deixando sem pais os seus filhos; os que matam as mulheres de outros pais – e, não poucas vezes as suas próprias -, deixando outros pais viúvos e outros filhos – por vezes, também os seus -, sem as suas mães; também são pais os que acediam, os que abusam, os que violam  e engravidam impunemente as filhas de outros pais – não raro as suas próprias filhas -, fazendo crescer o número dos filhos que não podem ter os seus pais para as coisas mais basilares da vida; são pais, aqueles homens que assassinam as filhas de outros pais, por sadismo, por ciúmes, “por amor”, por acreditarem ser os donos de suas vidas e proprietários dos seus corpos, deixando outros pais sem as suas filhas; do mesmo modo que são pais, aqueles que em nome do combate à corrupção, quebraram inúmeras empresas, grandes, médias e pequenas, lançando milhões de pessoas no desemprego, no subemprego, no bico, no biscate, na miséria, impedindo outros pais de levarem os sustento para os seus filhos e, assim, fazendo o País voltar ao mapa da fome da ONU; também são pais, aqueles que roubaram a grana da merenda, da saúde e da educação, deixando inúmeros filhos de pais, sem comer, sem aprender, sem saneamento básico, sem atenção à saúde; sem hospitais dignos, sem escolas funcionando e ensinando a ler o mundo; também são pais, aqueles que exploram o trabalhador em seus direitos, em seus salários; também são pais, aqueles que de posse de seus notebooks, de seus microfones, câmeras, de suas concessões de rádio e de televisão, se dedicam com empenho e denodo incansável, à tarefa de assassinar reputações de pessoas e de empresas; também são pais, aqueles que matam “marginais” que deixarão pais sem filhos e filhos sem pais; ah, também são pais, os salafrários, os calhordas, os patifes, os canalhas, os cafajestes; também são pais, os cachorros, os gatos, os jumentos, os cavalos, os hipopótamos, os elefantes, os rinocerontes; igualmente são pais, os carneiros, os bodes, os galos, os papagaios e os barbeiros. Embora a lista seja grande, ela não é exaustiva.

No entanto, há um macho, que por conta de sua natureza híbrida, não tem a capacidade biológica de ser inserido na categoria dos que são pais: o burro. Não fora ele filho de um cruzamento entre asininos e equinos, mesmo que o burro viesse com todas as fêmeas copular, jamais poderão procriar.

 

José Jorge Andrade Damasceno – indignado com tanta a criticidade intelectual, em meio a uma grande imbecilização, difundida pelas “redes sociais”.

  

quinta-feira, 7 de julho de 2022

Os limites, as limitações; os desdobramentos de ambos.

Uma música nunca antes ouvida

 

Os meus leitores mais argutos, certamente sabem que raramente eu escrevo neste espaço na primeira pessoa. No entanto, hoje, especialmente hoje, entre estas raras vezes, eu assim o farei.

Hoje, especialmente hoje – e, por favor, não me perguntem o por quê ... -, trago Os uma letra de Julio Iglésias que eu nunca houvera tomado qualquer contato antes. Hoje, especialmente hoje, topei com ela e, logo com ela me identifiquei plenamente. Tem uma característica de Salomão, o sábio autor do Eclesiastes - aquele que os analistas rasos e aligeirados rotulam como "pessimista". Ela é conduzida por uma afirmação realista, que, no entanto, poucas vezes se dá a devida atenção: “[...] La vida sigue igual”, não obstante a sucessão das pessoas e/ou das gerações; dos minutos, das horas e dos dias, e/ou o correr dos anos, das décadas ou dos séculos..

Colo abaixo a referida letra; não traduzirei, porque entendo que perderia um pouco do seu sentido,

caso o faça.

 

Julio Iglesias

 

“Unos que nacen otros morirán

Unos que ríen otros lloraran

Aguas sin cauces ríos sin mar

Penas y glorias guerras y paz

Siempre hay por quien vivir y a quien amar

Siempre hay por que vivir por que luchar

Al final las obras quedan las gentes se van

Otros que vienen las continuaran la vida sigue igual

Pocos amigos que son de verdad

Cuanto te halagan si triunfando estas

Y si fracasas bien comprenderás

Los buenos quedan los demás se van

Siempre hay por quien vivir por quien amar

Siempre hay por que vivir por que luchar

Al final las obras quedan las gentes se van

Otras que vienen las continuaran

La vida sigue igual"

Julio Iglésias, cantando em um filme de 1969.

Abaixo o link para quem a queira assistir:

 

https://www.youtube.com/watch?v=ULT_k5lvClY

 

Alagoinhas: 07 de julho de 2022 – inverno.

 

Jorge Damasceno – há pelo menos 50 anos assim: querendo entender os "por quês" ...

 

historiadorbaiano@gmail.com 

terça-feira, 28 de junho de 2022

UM ESCREVEDOR VOLTA A FALAR DE MEMÓRIA MUSICAL - XIII

Um escrevedor volta a falar de memória musical – XIII: com o rádio no pé do ouvido – Oton Carlos “Sweet Memories”.

 

Conforme já sabem os leitores habituados a este espaço, a escrita da “História” por meio da Memória vem ganhando espaço nos meios acadêmicos, mormente no campo das ciências humanas, uma vez que um crescente número de pesquisadores tem se interessado em desenvolver pesquisas neste campo, sendo cada vez mais abundantes e promissores, os resultados de estudos por eles entabulados. As publicações de bons trabalhos de pesquisadores envolvidos nas diversas áreas o saber – sobretudo no campo da história -, pode ser entendido como um sintoma do esforço que vem sendo feito, com o fito de dar maior visibilidade a protagonistas “anônimos da história” que, de outra maneira, não teria sua voz ouvida, nem suas trajetórias analisadas, nem mesmo trazidas ao público leitor, não fora aqueles que mergulharam na tarefa de apreender e refletir sobre vidas e cotidianos tão pouco visíveis pelo campo acadêmico e/ou editorial.

Do mesmo modo, já se disse aqui, que a memória é constituída a partir de uma seleção do que lembrar, do que silenciar, implicando em escolhas permeadas por sentimentos de pertencimento e, por vezes, apresentando ligeiros lapsos – mas, nem sempre esquecimento/apagamento, no sentido fisiológico da expressão -, indicando movimentos pendulares, quase nunca cronologicamente estruturados.

É também cediço, que este escrevedor teve no rádio o meio a partir do qual estabelecia contato com o mundo, na medida que os demais meios de comunicação, cada um conforme as suas especificidades, apresentava alguma barreira que o privava de aceder ao seu conteúdo. Assim, por meio do rádio, ele era informado, instruído; entretinha-se e recebia cultura e, ampliava o leque de conhecimentos propedêuticos.

No final da década de 1990,quando este escrevente residira em Salvador, ele conhecera pessoalmente um locutor a quem ouvira realizar entrevistas e apresentar programas de excelente conteúdo informativo e cultural, que, saliente-se, lhe foram deveras utilíssimos para a sua conformação intelectual e para o aprimoramento de sua leitura e apreensão do mundo, visto que, como já se asseverou, o seu acesso aos meios impressos de informação e formação, era quase inteiramente vedado. Aquele locutor era Oton Carlos: homem culto, dono de uma voz perfeita para o rádio; profissional amplamente reconhecido entre os colegas, mesmo os seus concorrentes de outros prefixos.

Para estranhamento de quem ora vos escreve, repentinamente aquele radialista desaparecera das suas audições de tardes ricamente passadas na companhia dos seus entrevistados, sem faltar a boa música e o noticiário, sempre nos horários aprazados: aos 25 minutos e aos 55 minutos de cada uma das horas de duração do programa.

Pouco antes daquele único contato pessoal entre o antigo ouvinte e o locutor, ficara sabendo que, a despeito da grande capacidade, perspicácia e inteligência de Oto, fora ele quase descartado do meio radiofônico, como um cristal trincado que não pode servir como “troféu” do seu dono, apenas, somente apenas, por ter se tornado cego, visto ter ele convivido por toda a sua vida com uma acentuada miopia, agravada por outras doenças oculares, inerentes a ela.

A sua perda visual foi grandemente agravada por perdas outras, perdas afetivas que foram fundamentais no seu processo de reajuste ao novo mundo em que era abruptamente inserido: perdera mulher e filha – a primeira chegando a dizer que “o cara a quem ela amava e com quem casara, não era aquele cego” -, além do emprego na radiofonia, que não só o sustentava, como também era a sua razão de viver.

Quando este escrevedor e a sua então consorte foram recebidos na sua casa, aquele locutor não era nem sombra do que fora antes da cegueira, no que tange ao prestígio, ao respeito e ao apreço de que gozara antes.

Por quê?

Como lembrança daquele apresentador do programa “Relax” na rádio Itapoan FM, ficou a belíssima música “Sweet Memories”, não menos lindissimamente interpretada por Ray Charles, exaustivamente tocada naquele programa e, incansavelmente ouvida por meio do rádio colado “ao pé do ouvido” deste garatujador, que traz do recôndito de sua memória, tão doce lembrança.

 

https://youtu.be/GWPVz4i9_Jg

 

Oton morre em março de 2020, contando pouco mais de 60 anos. Desde então, se queria escrever algo que o pudesse homenagear e, lembrar de um dos seus programas radiofônicos mais longevos na rádio Sociedade da Bahia, “Momentos inesquecíveis”.

 

José Jorge Andrade Damasceno – com saudade do amigo: distante, de poucos contatos outros; mas, amigo Oton Carlos.

 

Alagoinhas, 28 de junho de 2022. 

segunda-feira, 27 de junho de 2022

Eu quisera!

Eu quisera ser uma pedra!

 

Ah, se eu fosse uma pedra! Sim, uma pedra: uma pedra de mármore; uma pedra de granito; ou mesmo, um simples paralelepípedo!

Se fora eu uma pedra que faz carroçável o leito das ruas; que mesmo cuspida pelos passantes; calcada aos pés dos caminhantes; mesmo servindo de rolamento para veículos leves ou pesados... Ainda assim, ela, a pedra, se mantem impassível; inerte; insensível... Não reclama; não vocifera; não xinga nem se exaspera;

E, o que dizer da pedra  mármore ou da pedra granito: a despeito de ser cortada, de ser escupida; de servir para tamponar sepulturas; para embelezar fachadas.... não se exaspera, não vocifera, nem ri, nem chora ao ser cortada, batida a martelo, talhada a formões... Impassível, insensível, indiferente, inerte e silenciosa permanece!

Mas: uma pedra também estilhaça; mal manuseada: cai no pé e o machuca; nas mãos de enfurecidos fanáticos: mata; no atrito da  estrada: quebra para-brisas; na avalanche: esmaga... pessoas, casas, carros, algumas vezes, subverte cidades inteiras! 


José Jorge Andrade Damasceno - 27 de junho de 2022 - inverno no hemisfério e no coração!.

quinta-feira, 16 de junho de 2022

Histórias e Memórias de reveses - II

Histórias e memórias de reveses de um professor em princípio de carreira – II

 

A “Santa Inquisição” moderna, pautada pelas redes sociais, que impõem o “modus” como as pessoas devem viver, pensar, agir, reagir e se comportar mediante “prescrições” de regras morais, estabelecendo severo patrulhamento individual e;/ou coletivo e, que  condena indiscriminada e diariamente, todos quantos não possam ou não se queiram enquadrar aos dogmas e aos ditames construídos e transmitidos por meio de uma grande capilaridade de fios que formam o tecido tecnológico que envolve a chamada “sociedade global”. O conjunto de tais dogmas e normas que moldam o “ser social” forjado nos últimos vinte ou trinta anos, condiciona as gerações nascidas naquilo que se poderia denominar de “Era tecnológica”, na medida em que elas se sentem obrigadas a se encaixar nos “quadradinhos” a elas destinados, sem o que, passam a ser consideradas “deslocadas”. Talvez se possa encontrar ali, explicações para se ter um número tão grande de jovens emocionalmente doentes – fobias, depressões e outros distúrbios psicossociais -, lotando as agendas de consultórios psiquiátricos e, aumentando sensivelmente o número de pessoas que precisam de atendimento psicológico e, que são submetidas a prescrição/administração de remédios cada vez mais fortes.

Entre os tais “quadradinhos” a que estas gerações precisam se encaixar, está aquele em que não é permitido fracassar, tanto no que diz respeito ao aspecto profissional, quanto no que tange aos processos relacionados à obtenção de “prosperidade” econômica e social, ascensão política e cultural “feliz no amor”... Em suma: é proibido não vencer, em tudo que fizer ou lhe for cobrado fazer. Tanto pior, se a pessoa for considerada “bonita”, “inteligente”, “competente”, “apta”. Evidentemente, tais considerações são feitas a partir de uma avaliação tão superficial quanto subjetiva, visto que, grande parte das vezes, aquela pessoa sequer foi testada, para que se pudesse chegar a tais conclusões.

É assim que, neste segundo arrazoado, serão apresentadas mais algumas memórias de reveses sofridos por este escrevedor na sua caminhada rumo à sua inserção no mundo do trabalho docente. Tendo percebido que as portas estavam mais do que fechadas no setor privado, passou a considerar a possibilidade de iniciar o processo de preparação para o ingresso no ensino público, mediante a realização de concursos, por meio dos quais ele acreditava que algumas barreiras seriam quebradas, em tese, graças à “impessoalidade” daquele tipo de avaliação.

Foi assim que se dispôs a encarar o concurso para professor na rede estadual  de ensino, realizado em 1992. Depois de ter cumprido todas as exigências burocráticas impostas ao candidato, para que ele pudesse ter o direito ao recebimento do material avaliativo em Braille, tal não foi a sua surpresa, decepção e frustração, quando ao chegar no local da realização das provas, fora informado que para lá não enviado qualquer material especial para a consecução do certame.

Como é praxe neste País e neste Estado, procurou-se “dourar a pílula”, inventando uma solução: quem fora credenciado para fiscalizar o exame, acabara convocada para realizar a leitura do material para o candidato. Nem precisa dizer que a “emenda saiu pior do que o soneto”. Apesar da boa vontade da dita leitora e, a despeito de ser aa dita, professora: era analfabeta, no que tange à leitura. Pontuação, entonação, ritmo de leitura: zero, zero, zero.

Moral: reprovado. Este escrevente precisou lidar com o fato consumado de uma avaliação não feita, malfeita, fazendo com que ele tivesse de assistir ao acesso de colegas ao magistério público estadual, tidos e havidos como “fracos” e, ele, tido e havido como “forte”, estava fora.

Procurando virar aquela página, não sem muito esforço e sofrimento - pela perda; pelo atraso no acesso ao mercado de trabalho, acesso que tanto necessitava -, passou a buscar fazer uma revisão geral daquilo que estudara na graduação, visando submeter-se a algum concurso para a FFPA. Todo o ano de 1993 fora empregado nesta tarefa. Leituras sistemáticas, metódicas e disciplinadas foram desenvolvidas durante todo aquele período, mediante a contratação de ledoras – estas sim, competentes e escolhidas criteriosamente pelo interessado.

Para fazer face aos custos de tal empreitada, contou-se com a colaboração de um bom número de colegas; teve a franquia da biblioteca particular de um outro; obteve uma subvenção em dinheiro feita por um grupo de alemães que visitara o Vale da Nova Esperança e, simpatizara com a “causa” daquele estudante. Tal subvenção foi sine qua non, no processo de aquisição de obras necessárias para reforçar o trabalho de preparação para o tal concurso, que aliás, nem se cogitava realizar.

Entre os anos de 1994 e 1995, deu-se uma série de reveses nas pretensões daquele estudante, pois conseguira perder concursos, inclusive, para ele mesmo – na Uefs, fora candidato único; fizera excelente prova escrita; tropeçara fragorosamente na aula pública.

Cabe aqui salientar, de passagem, que para este garatujador, o ingresso no mestrado, nem de longe era alguma coisa plausível para a sua “realidade” intelectual. Ele dissera a alguém, recentemente, que terminar a graduação e conseguir um lugar para ensinar, já teria sido para ele um grande feito, uma grande conquista. Mas, quase que inadvertidamente, praticamente sem qualquer noção de construção de projeto de pesquisa, arriscou uma seleção na UFBA, no final de 1994. Ali, ele perdera exatamente onde era mais frágil no seu processo de formação: na prova teórica; seu futuro orientador acertara em cheio quando lhe dissera:

- Você não leu a bibliografia.

16 de junho de 2022

 

José Jorge Andrade Damasceno 

domingo, 12 de junho de 2022

Histórias e Memórias de reveses de um professor - I

Histórias e memórias de reveses de um professor em princípio de carreira - I

 

Há uma pressão social exercida pela mídia e pelas redes sociais, no sentido de fazer com que os indivíduos busquem o êxito em tudo que diz ou faz. A “Era das realizações”, imposta sobretudo aos jovens, assevera que um revés, ou um conjunto deles, é um sinal indicativo de incompetência e de fracasso, não só enquanto pessoa, como também como profissional.

É assim que, dificilmente alguém relataria, publicaria, ou mesmo daria a conhecer os infortúnios que sofrera no transcurso da vida, mormente, àquelas pessoas que não o conhecera antes do momento vivido.

Neste arrazoado, se buscará trazer a partir da memória selecionada por este escrevedor, alguns dentre muitos que ele vivenciara ao longo de sua vida. Os leitores que já frequentam este espaço, já conhecem alguns deles, relatados em outros escritos: as mortes prematuras de seus irmãos; a morte de sua mãe, bem como algumas facetas de seu caminhar e do farfalhar de sua genitora, no labor para lhe prover a roupa, o abrigo e o alimento.

Ao concluir a Licenciatura em História pela Faculdade de Formação de Professores de Alagoinhas, no ano da Graça de 1991, este escrevente precisava partir para buscar um espaço no mercado, na condição de professor há pouco habilitado para o ensino de História. Assim, saíra a procura de escolas onde pudesse exercer a tarefa docente, em todas recebendo recusas e escusas. Aqui vão três exemplos.

Certo dia de setembro, chegou a informação de que uma escola precisava de um professor de História, que pudesse atuar no turno da noite, a fim de cumprir o calendário. Visto que o horário não mais poderia ser refeito, o candidato já deveria ter concluído o curso e, por isto mesmo, era preciso que dispusesse de tempo livre naquele turno. Antes de se apresentar como postulante à dita vaga, este escrevedor asseverou aos seus colegas que, pelo fato de ser cego, a escola não o contrataria. Diante da “incredulidade” dos colegas, se dispôs e se dirigiu até o espaço de “educação” e “ensino”.

Saliente-se de passagem, que o dito candidato fizer contato telefônico com a direção do estabelecimento, para se certificar que a vaga ainda não houvera sido ocupada. Em resposta A tal pedido de  confirmação, o diretor que atendera o telefone, respondera que a necessidade de professor ainda não houvera sido atendida.

Não sem surpresa, ao chegar e se apresentar como postulante à vaga de trabalho anunciada, teve como resposta uma negativa e um comboio de caminhões de desculpas e escusas, tão vagas quanto inverossímeis.

Em um outro estabelecimento de ensino de prestígio na cidade, teve-se o cuidado de não se apresentar diretamente; fez chegar o seu curriculum à direção da escola, por meio de um amigo em comum. Nada de novo: as mesmas escusas; o mesmo palavrório inútil, insosso, insípido e inodoro: “inteligente”, “competente”, mas, incapaz de conduzir uma sala de aulas, cujos adolescentes podem sair e deixá-lo falando só, sem que ele sequer perceba. “Isto nos acarretaria um custo adicional, no sentido de contratar um outro funcionário, que viesse a desempenhar a tarefa relacionada ao controle da classe”.

O terceiro e último exemplo que aqui se poderia trazer como ilustrativo da dificuldade de um professor cego encontrar espaço no mercado do ensino privado, pode ser relatado em dois casos vividos fora da cidade de residência deste garatujador.

Em 1991/1992, a imprensa soteropolitana declarara uma “guerra” às escolas privadas da capital, pegando o mote dos altos preços das mensalidades cobrados, considerados abusivos, por uma pretensa classe média, que se via afogada nos custos para colocar e manter os seus filhos nos prestigiados colégios da cidade. Em meio àquela dita “guerra”, como uma possível solução para ela, surge uma cooperativa educacional, que se propunha a prestar serviços educativos, com preços justos e acessíveis. Para tanto, precisaria contratar docentes.

Ao chegar para postular uma daquelas vagas, na condição de professor de História, logo fora inquirido pela funcionária que organizava a fila, se estava ali para “matricular os filhos”. Ao ouvir que estava ali para postular uma vaga de professor, ouviu a resposta incrédula, quase desdenhosa: “a fila é aquela ali”, apontando para que o cego insolente, se dirigisse ao balcão onde se estava procedendo o cadastramento.

Tendo recebido a ficha, saiu; preencheu; voltou e entregou. Até hoje, no momento mesmo que se escreve estas linhas, espera-se a resposta, quanto à contratação.

Caso semelhante se deum, quando postulou uma vaga em uma famosa fundação educacional da região. Daquela vez, também fez uso de terceiros, que levaria o currículo do postulante até o setor de recrutamento. Inadvertidamente - ou talvez não -, a pessoa colocou no envelope em que se encontrava a documentação: “deficiente visual”. Igualmente, até hoje se espera a resposta, acerca da contratação.

 

12 de junho de 2022

 

José Jorge Andrade Damasceno – historiadorbaiano@gmail.com 

segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

Um escrevedor volta a falar de memória musical XII

Um escrevedor volta a falar de memória musical XII: o começo da caminhada – primeiro

semestre de 1980 – A Primeira Igreja Batista de Alagoinhas – As músicas de conjunto e os Hinos Avulsos.

 

A memória coletiva é um terreno deveras fértil e variado, nela podendo ser encontrados muitos registros que um indivíduo dado não guardou e que um outro trás de volta ao rememorar. Considerando-se a postagem anterior, ocasião em que se trouxe alguns registros relacionados aos solos individuais de pelo menos três pessoas que integravam a Primeira Igreja Batista de Alagoinhas no período aqui aludido – Isauri, Maria Rita Borges e José Santana -, um leitor atento deste espaço, embora tenha preferido manter-se no anonimato, ele  chamou a atenção deste escrevedor com respeito ao dueto formado pela irmã Isauri Moreira e o seu esposo, o irmão Cassimiro – in memoriam -, pois muitas vezes eles tomaram parte no desenvolvimento do culto – sendo ele um dos músicos da igreja, executando o seu velho Harmônio.

Acredita-se pertinente salientar de passagem, que este garatujador algumas vezes também cantou solos à capela, embora não fosse comum. Quase sempre era chamado para o fazer sem aviso prévio – portanto, sem se fazer acompanhar do seu inseparável violão -, lançando mão então unicamente do recursos vocal . \Lembra-se ele de ter cantado várias vezes

“Oh quando o momento chegar/De eu ir com Jesus habitar; em paz eu verei meu Senhor/em todo o seu resplendor.

“Em Cristo há perfeito perdão/Há nele real salvação; há nele também esta paz/que agora me satisfaz;

- “paz, paz/Sim paz/ hei de gozar a final; quando eu com Jesus me encontrar/no Reino celestial”

Este hino foi aprendido a partir das audições do disco de Luiz de Carvalho “Obra Santa”, em uma cansada radiola, na casa da irmã Alzira Moreira, carinhosamente conhecida por todos como “Irmã Dinha”, já de saudosa memória.

Luiz de Carvalho – quando o Momento Chegar – gravação de 1969.

 

https://youtu.be/eY4HgTiTyyk

 

Um outro hino avulso que este escrevedor tivera contato no comecinho de sua caminhada Cristã, foi “O Mundo há de Saber”, então interpretado por um grupo de jovens paulistas denominado “Os Ligados”, mas que chegou aos ouvidos deste que ora escreve este arrazoado, a partir da interpretação do conjunto musical da Primeira Igreja, o “Som Celeste”, já aludido em postagens anteriores, sob a regência e liderança de Edileusa Fonseca da Silva.

 

Os Ligados – O Mundo há de Saber

 

https://youtu.be/llyDJUlcNWE

 

Foi ainda através das participações do “Som Celeste” que se pôde tomar contato com algumas das excelentes produções de “Vencedores por Cristo”, como o hino linkado abaixo. Convém salientar que este escrevedor não conhecia a origens dos hinos interpretados pelo grupo musical em apreço.

Vencedores por Cristo – Volte à Vida – gravação de 1973

 

https://youtu.be/-Y9eElsg40w

 

Conforme já se aludiu em outros arrazoados, tudo era novo para aquele recém-chegado na Primeira Igreja Batista de Alagoinhas. “Hinetos”, “corinhos” e “hinos avulsos” se lhe soava estranho aos ouvidos ainda não familiarizado com aqueles vocábulos que, em síntese, queria dizer simplesmente que eram as músicas cantadas no transcurso do culto, que não estavam inseridas no “Cantor Cristão”, uma espécie de “livrinho” com os “hinos congregacionais”, que deveriam ser executados e cantados por toda a Igreja. Os “avulsos”, eram aqueles que estavam surgindo e caindo no gosto dos jovens – sobretudo -, mas também da liderança, o que acabava por induzir o restante do público.

Naqueles inícios dos anos 1980, com as comunicações ainda pouco ágeis, se destacava o grupo “Vencedores por Cristo” – entre outros, como Jovens da Verdade, os Ligados -, no que respeita à produção musical moderna e brasileira, que viria a substituir pouco a pouco a hinódia tradicional norte-americana, sobretudo, do Sul dos Estados Unidos da América do Norte. Para tanto, os “hinetos” eram introduzidos paulatinamente na “ordem do culto” e cantados várias vezes e em vários momentos da liturgia, para que fosse aprendido e apreendido pelos crentes.

No curso de quase dois anos que este escrevente permaneceu como partícipe daquela igreja, foram diversos os hinos que foram pacientemente ensinados à congregação. Alguns deles eram entoados com grande entusiasmo, sobretudo, nas manhãs de domingo, no momento imediato à escola dominical, que antecedia o “sermão” do pastor da igreja. Entre eles, seguem alguns, ao menos aqueles que mais marcaram a caminhada hinológica de quem ora escreve.

O primeiro e talvez o mais vibrante deles, fora dos primeiros que ouvira nos seus primeiros passos de “fé cristã”; era uma espécie de apologia “à volta de Jesus”, pregação muito presente nos sermões e hinos daquele princípio de década. Aqui foram colocados links a duas das versões que este escrevedor mais aprecia do “hinetos” “O Rei Está Voltando”. A primeira é com Feliciano Amaral, a que mais se aproxima do modo como era cantado na Primeira Igreja; a segunda,  mais recente, é uma interpretação de Luiz de Carvalho, feita com um coro e uma orquestra primorosos.

O Rei Está Voltando – Feliciano Amaral – gravação de 1974.

 

 https://youtu.be/V9iL5d0pYpM

 

O Rei Está Voltando – Luiz de Carvalho - gravação de 2001

 

https://youtu.be/Vu1vZo80-kA

 

Para concluir estas considerações, segue uma série de links para alguns dos corinhos mais cantados e apreciados por todos quantos viveram aquele momento ímpar da fé Cristã, entre os Batistas alagoinhenses.

Vencedores Por Cristo – Meu Coração – gravação de 1975

 

https://youtu.be/UPjibJjd9ME

 

Vencedores por Cristo – Hosana – gravação de 1975

 

https://youtu.be/H8-WxiemJLI

 

Vencedores por Cristo – Exaltar-te-ei / Levantai ó portas – gravação de 1975

 

https://youtu.be/XY51TAxZoK0

 

Johmara – Vai Abalar – gravação de 1982

 

https://youtu.be/tosgSg4iXhA

 

Era contagiante o entusiasmo com que o Pastor Jessé conduzia a igreja na entoação destes e outros hinetos do tipo

 

José Jorge Andrade Damasceno

– 10 de janeiro de 2022 

quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

Um Escrevedor volta a falar de memória musical XI

Um escrevedor volta a falar de memória musical XI: o começo da caminhada – primeiro semestre de 1980 – A Primeira Igreja Batista de Alagoinhas – Os “solos” “à capela” de Maria Rita, Isauri Moreira e José Santana.

 

Neste ponto do rememorar, faz-se necessário salientar que, ao passar a fazer parte de um determinado grupo social, cuja base de sustentação está fincada em um sistema religioso - conjunto das instituições econômicas, morais, políticas de uma sociedade a que os indivíduos se subordinam - diferente daquele em que transitara até então, é preciso reconstruir uma parte do pensar/falar, desenvolver uma nova maneira de compreender palavras novas e/ou incorporar entendimento diverso daquele que se possuía do vocabulário de seu domínio, bem como de sua utilização. Outrossim, fazia-se premente apreender e compreender os elementos constitutivos do constructo filosófico embutido nas novas práticas, falas e formas de pensar que o compõe. Tal entendimento não se fez senão com o passar do tempo e  com o acúmulo das experiências vividas no contexto em que fora inserido, na medida em que as percepções eram apreendidas e as reflexões eram desenvolvidas. Os traços mais relevantes se consolidaram como impressões indeléveis que ficaram gravadas no espírito de quem lembra, marcados pelo processo de inscrição de signos do vivido, em um dado transcurso de tempo. Conforme o postulado de Maurice Halbwachs (1877-1945), ”[...]: a lembrança é em larga medida uma reconstrução do passado com a ajuda de dados emprestados do presente, e além disso, preparada por outras reconstruções feitas em épocas anteriores e de onde a imagem de outrora manifestou-se já bem alterada. [...]” (HALBWACHS, 1990, p. 71). Esta é a premissa que tem norteado este conjunto de textos quem vem sendo escritos com o fito de trazer à lume algumas das reminiscências de um viver já pretérito.

Aqui, em primeiro lugar, se quer destacar para fins ilustrativos, os usos da palavra “solo”, para além dos significados que o “novo convertido” conhecia até a sua inserção entre as pessoas que professavam a Cristo, em uma igreja Batista. A acepção primeva que este escrevedor conhecia, obviamente, era a relacionada ao lugar em que se pisa, se planta, se vive – “[...]      conjunto das acumulações de partículas sólidas que constituem a crosta terrestre, desde os profundos depósitos geológicos até as camadas de superfície [...]” -, além das acepções poéticas indicativas de “solo pátrio”, sem falar daquelas relacionadas à biologia e à geografia, que são ensinadas/aprendidas nos livros e nas escolas. Recorrendo ao dicionário, são encontradas outras acepções da palavra solo, desta feita,  no campo da música, por exemplo, algumas das quais também eram suas conhecidas, mas, sempre relacionadas à execução instrumental. Diz assim o dicionário Houaiss da língua portuguesa, trazendo uma acepção utilizada a partir de 1720:

“[...] passagem ou trecho musical para ser executado por um só instrumento ou uma só voz, com acompanhamento ou não, em conjunto coral ou orquestral”.

“[...]diz-se de instrumento musical ou cantor que se apresenta solando; solista.

“[...] realizado, desempenhado, tocado, executado etc. por uma pessoa apenas [...]”.

 

Como exemplos do postulado acima, se poderia elencar os solos que este escrevente escutara pela vez primeva naqueles já distantes anos de sua vivência na Primeira Igreja Batista de Alagoinhas, por meio de vozes como as de Maria Rita Borges, Isauri Moreira, dentre outras, que em geral, executavam os seus solos “à Capela”. Aliás, uma outra expressão que causou estranheza ao recém-chegado, pois para ele, a palavra “capela” tinha uma conotação diferente daquela empregada no linguajar musical que circulava no seio dos Batistas de então.

Abaixo o link para três hinos que ilustram bem o que acima fora postulado. Cabe salientar de passagem que, em geral, os “solos” eram executados “à capela” por algumas razões. Uma era que, quase sempre os jovens que tocavam os instrumentos que então eram heterodoxos na liturgia, ou não conheciam os hinos ou não gostavam dos tipos de hinos que as senhoras e os irmãos um pouco mais maduros gostavam de cantar, indicando uma certa má vontade com aquela geração que estava sendo sucedida por eles. Uma outra razão que se poderia apontar é que se tratava de músicas inseridas no Cantor Cristão e, que por conseguinte, deveriam ser executadas por musicistas que tocassem os instrumentos classicamente usados no espaço de culto. Talvez aqui se pudesse apontar mais uma razão para aquela geração, considerada em vias de sucessão pelos jovens instrumentistas, preferirem executar os seus “solos” “á capela”. Talvez se possa dizer que eles apresentavam uma resistência velada àqueles novos instrumentos que “invadiam” o espaço de culto, passando inexoravelmente a fazer parte da liturgia cúlticas. Daí talvez se poder inferir que, ao cantar os seus hinos preferidos sem quaisquer acompanhamentos instrumentais, pudessem se fazer entender melhor, evitando aqueles sons que lhes soavam mal aos ouvidos, cuja educação musical ainda era clássica e tradicional.

 

Compensa servir A Jesus – Arautos do Rei.

 

 

 

https://youtu.be/5hPeSJsjwq0

 

Mensagem real –

 

 https://youtu.be/cY_m7LPQ1Lg

 

Ao Meu Redor – Luiz de Carvalho

 

https://youtu.be/_7r_ESMvAeA

 

05 de janeiro de 2022.

José Jorge Andrade Damasceno

Alagoinhas - Bahia