domingo, 26 de setembro de 2010

História e Memória de Eleições Presidenciais: Um Editorial do Estado de São Paulo

História e Memória de Eleições presidenfciais: Um Editorial do “Estado de São Paulo”.
Jorge Damasceno
Domingo, 6 de outubro de 2002 – Era manhã e o autor destas linhas se preparava para o exercício “obrigatório/democrático” do voto. Como de hábito deu uma navegada pelos jornais que tinha acesso na internet, quando se deparou com o editorial do jornal da família Mesquita, cujo título poderia não levantar desconfianças, já que indicava que o processo democrático não só estava em curso mas, que ainda melhor, estava imune aos revezes que sofrera até bem pouco tempo. Crê-se pertinente a reprodução do editorial em causa, para que seja preservada a linha de raciocínio do editorialista. Com o título de “Democracia consolidada”, diz o jornal paulista:

“Hoje, como há dez anos, o Brasil vive sob o signo da incerteza. A 29 de setembro de 1992, a Câmara dos Deputados aprovava o início do processo deimpeachment do presidente Fernando Collor. Três dias depois, ele seria obrigado a afastar-se do governo por decisão parlamentar, enquanto durasse o processo. O alívio experimentado pela quase totalidade dos brasileiros trazia, porém, uma angustiante contrapartida - a dúvida sobre o destino da ordem democrática, restabelecida, afinal, não fazia tanto tempo assim e em via de ser submetida ao que poderia ser uma dura provação.
“Hoje, quando 115 milhões de brasileiros participam da quarta eleição presidencial do Brasil redemocratizado (e da oitava, apenas, pelo sufrágio secreto em 113 anos de República), não há a menor inquietação sobre a saúde do regime político nacional. No decênio entre a campanha para a cassação do mandato de Collor e a sua renúncia e o ocaso natural da era Fernando Henrique, a democracia brasileira alcançou um grau de robustez e de enraizamento reconhecido no mundo inteiro. A competição pelo voto modernizou-se e civilizou-se: nunca se avançou tanto rumo à igualdade de oportunidades eleitorais.
“O partido cujo tetracandidato ao Planalto pela primeira vez chega ao dia do pleito como favorito e que há não mais de três anos dava guarida à fantasia golpista do impeachment do presidente, agora louva – embora raramente em público - o comportamento de "magistrado" de Fernando Henrique. Tardiamente, a cúpula do PT reconhece o papel daquele a quem tratou muitas vezes até com torpeza, na consolidação da estabilidade institucional, incluindo um inédito e sofisticado processo de transição de governo, sob a condução do chefe da Casa Civil da Presidência, ministro Pedro Parente.
“A importância que o presidente dá a essa transição e os cuidados com que ela vem sendo montada podem ser medidos pela recente viagem que Parente fez aos Estados Unidos, onde se encontrou com os membros da alta burocracia federal que participaram do mesmo processo no caso da mudança da administração do democrata Bill Clinton para o republicano George W. Bush. Mais do que isso, ele examinou em profundidade os procedimentos-padrão de há muito adotados nos Estados Unidos para esse fim. Esse investimento institucional se destina a ser o ponto culminante dos esforços de atualização do Estado brasileiro empreendidos nesses 8 anos.
“Para preservar a integridade operacional do Poder Executivo, o governo Fernando Henrique definiu um rito de passagem decerto incomum entre os países ditos emergentes. Compreende a nomeação de 51 funcionários indicados pelo vencedor do pleito e pagos pelo Tesouro para fazerem a interface com os seus equivalentes da atual equipe, a preparação de uma agenda com o cronograma dos compromissos internos e externos da União nos primeiros 100 dias do ano que vem e até a elaboração de um glossário com os termos técnicos adotados pelos administradores federais.
“Se, além de tudo, Fernando Henrique será o primeiro chefe de Estado brasileiro em 42 anos a transmitir o cargo ao sucessor eleito pelo voto direto, por que a sensação de incerteza em amplos setores da sociedade? É que escasseiam razões de otimismo sobre o que acontecerá depois, diante dos severos constrangimentos macroeconômicos que assombram o País. Seja qual for o sucessor de Fernando Henrique, a conjuntura desfavorável não se dissipará tão cedo. E o risco de que se deteriore será muito maior caso se confirme o favoritismo do petista Lula da Silva.
“Mesmo que, no poder, Lula comprove não ter sido mero artifício de marketing o seu decantado abandono do radicalismo, e mesmo que seja mínima, como se prevê, a sua margem de manobra para mudar abruptamente a política econômica, o Brasil terá de se haver com um conjunto de ponderáveis fatores de risco: as limitações de seus conhecimentos, a inexperiência administrativa, as inevitáveis tensões com um Congresso onde a atual oposição continuará minoritária, a falta de uma estratégia coerente de governo (que não é sinônimo de programa de governo) e a massa de demandas sociais suscitadas pelas próprias promessas irrealistas do candidato
“. Motivos de desassossego, portanto, não faltam. Daí a nossa convicção de que um segundo turno, com a eventual vitória de José Serra, seria uma alternativa muito mais tranqüilizadora.”.
Como sepode depreender do texto transcrito acima, assim como tentando compreender o que está publicado no editorial de hoje, 26 de setembro de 2010, o Estado de São Paulo, não apenas expressa com clareza sua posição em relação ao pleito eleitoral deste ano, como aponta o caminho que vai trilhar, no caso de seu posicionamento não ser acompanhado pela maioria dos eleitores brasileiros. O que aliás, não pode ser tomado como surpresa, haja visto os posicionamentos adotados pelos jornalistas e proprietários do Estadão, nestes oito anos de governo “Lula Da Silva”, como eles mesmos se referem ao presidente Lula..
Jorge Damasceno é professor Adjunto da Universidade do Estado da Bahia, Doutor em História Social, Pela universidade Federal Fluminense.
E-mail: historiadorbaiano@gmail.com
Twitter: @JorgeDamasceno1