segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Um escrevedor volta a falar de memória musical III – Com o rádio no pé do ouvido: 1978 entre o auge da “Discoteque” e a morte de dois Papas.

Um escrevedor volta a falar de memória musical III – Com o rádio no pé do ouvido: 1978 entre o auge da “Discoteque” e a morte de dois Papas.

 

O ano começa como todos os anos até aqui já vividos por este escrevente: milhares de felicitações e vãos desejos de “um ano bom”; um grande número de expectativas afloradas no curso de uma vida que se aproximava do ano da maior idade, que se preparava para o alistamento militar, a retirada de novos documentos, o reinício de mais uma temporada escolar, prometendo mais tropeços  em meio à raiz quadrada, à famigerada equação do primeiro grau, com seus jogos de sinais, números dentro e fora dos parêntesis, dos colchetes e das chaves... coisas que se embaralhavam no bestunto do aluno que partia para cursar a segunda sétima série, já que no ano anterior, ele a abandonara por se apresentar com grande dificuldade para operacionalizar aquelas complicadas sentenças matemáticas e, pior do que isto, poder demonstrar aos professores os parcos resultados alcançados, visto que naquele caso, a ferramenta datilográfica não o ajudaria. Se recusando a uma reprovação por conceito, optou pelo abandono, após fazer algumas contas e entender que não alcançaria a média naquela matéria que teimava em não se deixar apreender pelo seu bestunto. D

Mas, o camarada não era de todo rude; além de obter alguns progressos no aprendizado de violão, também conseguiu chutar uma bola, adaptada pelo seu colega de vadiagens. Nesta toada, foram realizadas algumas partidas envolvendo os cegos de Salvador, Alagoinhas e Feira de Santana, nas quadras do 4º batalhão da Polícia Militar e no clube Acra; no clube de regatas Itapagipe e na quadra do hoje já inexistente ginásio do Balbininho em Salvador – aliás, horrível para os cegos que ouvem mal! – e na quadra do Tênis clube de Feira de Santana, além de Candeias, do centro social urbano da Caixa D’água.

Aquele ano também foi marcado pelo êxito da música “dancing”, que já entrara no Brasil um tanto tímida, uns  dois ou três anos antes. No entanto, 1978, ela ganhou força junto ao público jovem, não só com um grande número de faixas internacionais, como com algumas versões e, até mesmo alguns grupos especialmente criados para surfar naquela nova onda.

 

Grace Jones - La Vie En Rose –

 

 https://youtu.be/YEM8TspcCBY

 

John Travolta & Olivia Newton-John - Summer Nights –

 

https://youtu.be/A_J2bcNx3Gw

 

John Travolta & Olivia Newton-John - You're The One That I Want –

 

https://youtu.be/e__Pp4FxsjU

 

No ano anterior, Rita Lee já satirizava aquele modismo, bem à maneira brasileira:  

 

https://youtu.be/HTcTODxRN4k

 

E, no ano seguinte, ela reforça a sua sátira, precisamente com algumas músicas que embarcaram nos “embalos de sábado à noite”. Mas, saliente-se de passagem, que ela mesma não se poupou da acidez de suas críticas:

 

https://youtu.be/NOvMzyCTBlc

 

Ao mesmo tempo em que Caetano Veloso cantava São Paulo, de um modo um tanto quanto filosófico, já que a expressão “Narciso acha feio o que não é espelho”, acabou por ser uma espécie de “emblema” daquela São Paulo que ele retratara em “Sampa”:

 

https://youtu.be/Nmxp4XQnBpw

 

Mas, sem qualquer sombra de dúvidas, a música que mais  refletiu o estado de ânimo daquele brasileiro que já começava a ganhar algum entendimento do cenário político do país foi “Cálice”, magistralmente interpretada por Chico Buarque de Holanda e Milton Nascimento, não sem grandes dificuldades, visto que a Censura Federal era implacável com as letras de Chico, embora aquela gente pouco entendesse dos seus versos, apenas tidos por “subversivos”.

 

https://youtu.be/9y2xB90A0CY

 

Como sempre, este escrevedor ouviu pela primeira vez esta música, através da rádio Mundial do Rio de Janeiro, bem como através da rádio Jornal do Brasil, no cair da tarde ou ao anoitecer, que a propagação hertziana facilitava a chegada daquelas emissoras de rádio “AM” por estas paragens. Muitas vezes com o rádio apertado ao ouvido, buscando uma melhor absorção tanto da melodia, quanto da letra que emanava daquela interpretação precisa do momento político e social de repressão e truculência propugnada pelo governo dos generais, iniciado pelo golpe de 1964.

Já no segundo semestre do ano de 1978, tendo retornado de uma daquelas partidas de futebol acima mencionada, ao chegar em casa, já quase por volta das oito da noite de um domingo, 6 de agosto, como habitualmente fazia, encostou o rádio ao pé do ouvido para se inteirar das notícias e, também pela rádio Jornal do Brasil, este garatujador ouviu a notícia da morte do Papa Paulo VI, que, como seria de se esperar, desencadeou uma grande comoção entre os professantes da fé católica, embora aquela morte tenha se dado dentro das premissas naturais do viver humano.

No entanto, a surpresa ficaria por conta da morte do seu sucessor, João Paulo I, que governara os católicos pelo curto período de pouco mais ou menos três meses. Mais intrigante do que o seu efêmero pontificado, foi o mistério que envolveu a causa e a circunstância de sua morte.

 

José Jorge Andrade Damasceno – 13 de setembro de 2021. 

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