terça-feira, 28 de setembro de 2021

Um escrevedor volta a falar de memória musical – VIII: o começo da caminhada – primeiro semestre de 1980 – A Primeira Igreja Batista de Alagoinhas e as primeiras músicas evangélicas – Parte I.

Um escrevedor volta a falar de memória musical – VIII: o começo da caminhada – primeiro semestre de 1980 – A Primeira Igreja Batista de Alagoinhas e as primeiras músicas evangélicas – Parte I.

 

Já vai longo o conjunto de arrazoados que se vem escrevendo neste espaço, apresentando alguns dos aspectos relacionados com o caminhar iniciado em janeiro de 1980, quando se deu um passo importante no sentido de promover algumas mudanças no que respeita a busca de definições para a vida daquele que completara 19 anos, ao findar dezembro. A partir do vigésimo dia daquele novo ano, este escrevedor passava a professar a Fé Cristã Protestante, inserindo-se na Primeira Igreja Batista de Alagoinhas, a partir de onde passaria a confessar a Cristo, publicamente, não só dizendo às pessoas, bem como, procurando viver de modo que tal Fé pudesse ser percebida no seu falar, no seu agir e no seu relacionar-se com a sociedade. Uma das mudanças práticas que precisava ser materializada, se referia ao hábito de fumar. Tal hábito fora adquirido aos quatorze anos, quando ingressara na quinta série e, fora reforçado quando retomara a sua liberdade ao voltar do instituto. Apesar de requerer alguma disciplina e persistência, como dissera a um amigo de farras pretéritas, o último cigarro fora fumado na manhã daquele domingo, pois já estava decidido a ingressar no meio Batista, a partir da noite daquele mesmo dia. E, assim foi.

E, prosseguindo no processo de mudanças inerentes ao novo caminho que resolvera começar a trilhar, era necessária a efetivação de uma reforma substancial no seu linguajar. Embora fosse dotado de um vocabulário vasto e rico, se habituara ao uso frequente de palavras prenhes de torpeza, indecência e que expressavam imoralidades, não apropriadas para serem usadas por quem pretendia se apresentar como tendo sido investido de “novidade de vida”. Aquele exercício fora um tanto de mais difícil execução, uma vez que o hábito de as proferir, exigia do rapaz constante cuidado, tanto mais que ele era constantemente provocado por aqueles que afirmavam não acreditar que houvesse mesmo “virado crente”. A sua dificuldade em estabelecer um novo padrão de linguagem, estava mais na superação de hábitos e não na ausência de um conjunto vocabular que lhe permitisse um falar agradável. Nisto, como em vários outros aspectos de sua vida, o rádio foi um grande colaborador, uma vez que as grandes emissoras de rádio que sempre ouvira, possuíam um grande cuidado na hora de escolher aqueles que se colocariam diante dos microfones, uma vez que a correção gramatical e a dicção foram a grande marca daqueles locutores que atuavam no rádio AM. Até mesmo as emissoras do interior possuíam o cuidado naquele campo.

Assim, dado o passo inicial no sentido de passar a fazer parte daqueles que congregavam naquela Igreja, logo procurou se instruir em relação aos dias e horários dos cultos; logo procurou apresentar-se disposto a enturmar-se com os demais integrantes daquele corpo eclesiástico, não obstante a sua imensa e quase insuperável dificuldade de interagir coletivamente. Tanto é assim que, ao que tudo faz crer, o líder daquela igreja se apercebeu de tal característica de uma das suas mais novas ovelhas e, partiu para a tarefa de envolvê-la nas atividades eclesiásticas e/ou extra eclesiásticas, o quanto estivesse ao seu alcance, sem, contudo, preterir esta ou aquela ovelha em dificuldades semelhantes. Prova disto é que algumas semanas mais tarde, já o levava como companhia nas suas viagens para visitar algumas congregações às quais prestava assistência, nomeadamente, uma que se localizava na cidade de Itapicuru, há cerca de cento e quinze quilômetros de Alagoinhas.

Em um final de tarde de outono, este escriba estava assentado nos fundos do pavilhão Luiz Vianna, aguardando o próximo horário de aula, que se realizaria no Jairo Azi, quando é surpreendido pela escuta de uma voz que o chamava pelo nome. Aquela voz já lhe ficara familiar: era o pastor Jessé, que fora ali para convidar aquele rapaz para juntos irem a uma atividade que desenvolveria em Olindina/Itapicuru. Dada a distância e o estado de conservação da estrada, teriam que sair antes das seis daquela tarde, pois precisaria estar no local de destino, aproximadamente as sete e trinta. Tendo objetado que não houvera avisado a sua mãe que não chegaria em casa no horário de costume, Jessé veio com ele para informar a dona Manda que o seu filho iria com ele em uma viagem. Não a encontrando em casa, pediu a vizinha que desse o recado. Aproveitando a ocasião para trocar a camisa da farda por uma limpa e cheirosa, pastor e ovelha embarcaram para aquela que fora a primeira de muitas viagens que fizeram juntos, para aquele mesmo destino.

Eram já cerca de cinco e meia, quando pegaram a estrada BR110. Era um Volkswagen Brasília, já com alguma quilometragem, mas bastante robusto e conservado. Nele, havia sido instalado um equipamento já bastante difundido à época, um rádio-toca-fitas. Sempre ávido por músicas e, em tal ocasião, ávido por conhecer o que se ouvia entre os protestantes Batistas, apropriou-se do equipamento e passou a tocar as fitas que o motorista disponibilizara para que pusesse a rodar. E, de cara, a fita que inseriu em primeiro lugar, continha vários hinos cantados pela Missão Vencedores por Cristo, grande parte delas estava em uma série de discos chamada “Louvor”. Assim, Sempre que as ouvira, em qualquer lugar ou tempo, imediatamente a memória daquelas viagens, daquele batucar das pedras da estrada no assoalho do carro; daquele frio provocado pelo fato da vedação do veículo já não poder conter a passagem do vento – um ar condicionado natural -; daquele indisfarçável sono que quase tornava inútil a companhia para o motorista; da receptividade dos irmãos daquelas igrejas, tanto ao Pastor a quem amavam e respeitavam muito, quanto ao seu companheiro de viagem, que era tratado com fidalguia e desvelo; aquela coalhada saboreada em Olindina, na casa do pastor Luís e sua senhora, irmã Sulamita – a vergonha e o pejo de comer em companhia de pessoas estranhas ao seu convívio (será que estão reparando no desajeitado companheiro de viagem do pastor?) -, emerge viva e se faz presente, a despeito das camadas que a recobrem.

Abaixo, serão colocados os links para três daquelas músicas ouvidas por todo o trajeto de ir e voltar, a fim de que, quem já as conhece lembre; quem não as conhece, desfrute daquele momento de revolução na produção musical Cristã protestante, que se produzia a partir do início da década de 1970. Saliente-se, que este escrevedor não tinha qualquer conhecimento a tal respeito, no momento em que vivenciara aquela virada na hinologia cristã produzida e cantada no Brasil. Tal conhecimento por parte do autor destas linhas, é muito posterior ao novo curso que a adoração musical tomava.

 

A primeira das três músicas escolhidas para trazer aos ouvidos dos leitores é, “Minha Paz vos dou”: vencedores por Cristo, em gravação de 1975. Esta, talvez tenha sido aquela que permaneceu viva na memória por mais tempo, mesmo quando não estimulada por audições posteriores.

 

https://youtu.be/HPKlkjlFwFQ

 

Esta abre o disco e, claro, foi a primeira a aparecer na fita tocada. “Louva a Deus”: Vencedores por Cristo, em gravação de 1975.

 

https://youtu.be/orQo9rS_KQY

 

O hino que se ouvirá em seguida, deixou marcas profundas e duradouras em grande parte daqueles que a conheceram e cantaram. “Faz-me Chegar”: Vencedores por Cristo, em gravação de 1975.

 

https://youtu.be/-kccM79Wppo

 

Esta, por sua vez, ganhou muitas versões, para quem garatuja este arrazoado, a mais bela delas, está no segundo volume de “Luiz de Carvalho e Denise Juntos”. “Pai de Amor”: Vencedores por Cristo, em gravação de 1975.

 

https://youtu.be/Js0wBjWTKWc

 

Portanto, informado a respeito da programação da Igreja, passa a frequentar com regularidade, intentando familiarizar-se com a liturgia de culto, com as músicas e demais atividades cúlticas desenvolvidas ao longo da semana. Um dos primeiros com o qual se identificou imediatamente, era realizado todas as terças feiras, as cinco e trinta da manhã: o “culto matutino”. De baixa frequência, sobretudo por parte dos jovens, era ali que as pessoas contavam as suas dificuldades, pediam as orações dos irmãos. Mas, como não poderia deixar de ser, era ali que também nasciam os mal-entendidos e as especulações, principalmente, quando alguém dentre os que pediam orações aos presentes, não relatavam minunciosamente a situação vivenciada, motivava a necessidade de que se orasse. Mas isto é uma outra história.

No campo da música, era grande a riqueza; tudo era novidade; tudo era surpreendente. Contrariamente ao que se acostumara, em geral eram músicas com melodias agradáveis aos ouvidos, que possuíam uma teologia escriturística expressa em poesias coerentes, uma cristologia sólida, sóbria e biblicamente fundamentada. Para aquele recém-chegado, nem tudo era plenamente compreensível, o que só passaria a sê-lo com o passar do tempo e o amadurecimento na fé, além da ampliação do conhecimento do Evangelho.

Além do canto congregacional que envolvia toda a igreja na tarefa de entoar os hinos a partir do Cantor Cristão, que era hinário oficial da denominação, também se cantava os chamados “hinetos” ou corinhos, envolvendo músicas que não faziam parte da coletânea de hinos tradicionais inseridos no mencionado hinário - em tais ocasiões, pouco a pouco, eram introduzidas as novas filosofias melódicas que começavam a circular, primeiro entre os mais jovens. Mas, também havia um conjunto musical formado pelos jovens da igreja, encarregado de executar hinos outros, de origem autoral mais contemporânea. Era o “Som Celeste”, liderado e regido pela Educadora Cristã, Edileusa Silva. Este garatujador não conseguiu se engajar naquele conjunto vocal, por não se sentir à vontade para fazer parte de um grupo que já estava consolidado, sem falar de sua pouca inclinação para o desenvolvimento de atividades coletivas, que exigia ensaios, implicando em disciplina e mais deslocamentos para cumprir mais aquele compromisso.

Aqui vão três hinos que ficaram marcados no rememorar deste escrevedor. Ao ouvi-los, sempre ressurge de lá do fundo das camadas que cobrem e recobrem a memória, as vozes que magnificamente os cantavam, fique claro, após árduo trabalho de ensaios e regência de Edileusa. É interessante notar que, ao tocar os hinos cujos links se encontram abaixo, parece se estar a ouvir a voz de Edileusa imiscuída às vozes de todo o grupo. Ah, aí o tempo implacável age e age com toda a sua força. Mas, ainda não conseguiu apagar as lembranças que teimam em se esforçar por emergir do meio dos mais de quarenta anos que já decorreram até aqui.

 

A primeira delas é “Deus é Real” na interpretação de Vencedores Por Cristo, que integra o LP com o mesmo título, gravado em 1973

 

https://youtu.be/ElqtxrQyEYs

 

A segunda é “Nada Melhor, também com  Vencedores por Cristo e, do mesmo disco:

 

https://youtu.be/kQgtIkvWJL4

 

A terceira é “Aleluia”, no entender deste garatujador, a mais bela melodia, igualmente interpretada por– Vencedores por Cristo e, inserida naquele mesmo disco de 1973:

 

https://youtu.be/x4iqzlPYq7A

 

José Jorge Andrade Damasceno – historiadorbaiano@gmail.com]

 

28 de setembro de 2021. 

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