Quando a rádio era “emissora” e as “ondas eram médias”. –
Alagoinhas, 1954-1974.
A memória dos alagoinhenses que já dobraram o “cabo da boa
esperança”, é marcada pelas músicas, pelos programas e pelos apresentadores que
fizeram chegar aos cantos e recantos da cidade, através das ondas médias da
Z.Y.C.31, prefixo que identificava a rádio Emissora de Alagoinhas.
Quando este escrevedor passou a ouvir rádio com
regularidade, os estúdios da rádio Emissora estavam instalados à Rua Dom Pedro
II – 117 -, para onde fora transferida logo após um incêndio que irrompeu em
suas instalações, então situadas à rua Rodrigues Lima.
Cabe salientar que aquele não fora o único acidente com fogo
que marcou a trajetória da referida rádio. Os seus transmissores, instalados no
conjunto Pinto de Aguiar, também sofreu um incêndio, que quase ceifou a vida
daquele que era responsável pelo funcionamento da unidade irradiadora. Graças à
rápida compreensão do que se passava no local, a despeito da precariedade das
comunicações da época e ao rápido intervir das pessoas que acorreram para o
local sinistrado, logo o fogo foi combatido e o mal minorado.
Voltando ao rememorar aqui proposto, salienta-se que a sua
programação era fundamentalmente constituída por músicas – cuja diversificação
era estabelecida de acordo com os horários e/ou apresentadores -, novelas
gravadas – como Irmãos Coragem de Janete Clair, em uma adaptação radiofônica -,
esporte – marcadamente limitada aos jogos no Carneirão (embora o campo da LDA e
o campo do Curtume tivessem sido palcos de algumas partidas irradiadas) - e
algumas notícias, mormente a Voz do Brasil.
No entanto, ao se mencionar o campo da “notícia”, convém
salientar que a rádio Emissora de Alagoinhas levara ao ar, por um bom tempo –
talvez o da vida do seu apresentador -,um programa que talvez fosse único por
ela transmitido, conforme a memória de quem escreve estas linhas. Trata-se do “Alagoinhas
em revista”, que entrava no ar as treze horas, sob a direção e locução de Célio
Machado. Como o rememorador era muito tenro, não saberia dizer exatamente qual
o teor do programa; entretanto, é preciso no fato de que a única música que
tocava era, na abertura, nas pausas comerciais e no fechamento, que se dava,
crê-se, as quatorze horas, “Moonlight Serenade”, tocada pela orquestra de Glen
Miller.
https://youtu.be/rjq1aTLjrOE
Tais acordes, ao serem ouvidos por este escrevedor,
imediatamente o remete àquele programa, que, certa vez o recebera para uma
entrevista, acompanhado de uma de suas professoras - talvez fosse a professora Inis Farani de Freitas, que bem mais tarde, este
escrevinhador veio a saber tratar-se da irmã do candidato a governador do Estado
baiano, o engenheiro Lauro Farani de Freitas, sinistrado em queda de avião durante
a campanha eleitoral em 11 de setembro de 1950, na cidade de Bom Jesus da Lapa.
Aquele menino, ao ser entrevistado no programa “Alagoinhas
em Revista”, ainda se limitava a dar respostas monossilábicas, talvez intimidado
pelo vozerio do entrevistador ou pelo microfone que, em sua memória tátil, se
lhe afigura como uma gerigonça metálica, com dentes cumpridos, bem abertos e dispostos no sentido vertical, dando-lhe a
impressão que o poderia morder!
Antes de ser levado ao ar pelas ondas médias daquela rádio
que levaria a sua voz ainda incerta e em processo de mudança de registro, sabia-se
lá até onde, o entrevistado mirim passara pela sala do diretor que o recebera e
mantivera uma conversa amigável com aquele menino – não se tem registro de
outra conversa entre estes interlocutores, depois de um deles ter se tornado
adulto.
Em um espaço impregnado do forte odor de fumo, devido ao
fato de que o locutor era um tabagista inveterado, se desenrolou um pequeno
diálogo entre os dois, talvez, se tratasse de um meio que o entrevistador
utilizasse para conhecer o seu entrevistado e lhe formular as perguntas no
momento mesmo da entrevista.
Uma outra marca da rádio Emissora de Alagoinhas foi, conforme
lembra este escrevedor, o programa “Parabéns pra você: o carnê social da cidade”,
irradiado, crê-se que ao meio dia, de duração curta durante a semana, porém, um
pouco mais alongado aos domingos. Nele, os ouvintes – crê-se que mediante
alguma quantia em dinheiro, talvez simbólica – pedia que fossem tocadas músicas
que seriam oferecidas aos aniversariantes do dia. Além das efemérides
natalícias, havia irradiação do programa em datas especiais, como por exemplo, “dia
das mães”, “dia dos pais”, entre outras possibilidades.
As músicas pedidas, executadas e oferecidas aos
aniversariantes, eram selecionadas de acordo com as demandas feitas por
parentes e amigos dos homenageados -, certamente, eram escolhidas de acordo com
o gosto musical de quem receberia os “parabéns”. Variava do “sucesso” do
momento – como os interpretados por Roberto Carlos, Nelson Ned (Domingo a
Tarde), Jerry Adriani (Coração de Cristal; O quanto te quero), Antônio Marcos (Oração
de um jovem triste), Erasmo Carlos (Sentado à beira do caminho”, entre outros -,
passava por aquelas que quase não eram mais tocadas – como aqueles interpretados
por Emilinha Borba, Orlando Dias, Francisco Alves, dentre outros -, construindo
um mosaico de gostos e ritmos.
Havia algumas músicas e intérpretes que tinham presença
constante em quase todas as edições do “Carnê Social da Cidade”. Entre tantos,
poder-se-ia mencionar “A Triste Partida”, toada de Patativa do Assaré, com
magistral interpretação de Luiz Gonzaga; Carequinha (O passarinho do relógio), presença
quase certa, quando os homenageados eram crianças, os mais maduros eram
brindados com execuções primorosas de Dilermando Reis (Som de Carrilhões).
Muitas outras memórias certamente emergirão daqueles que se dignarem a ler
estes rabiscos de reminiscências.
E, em se falando do virtuoso violão de Dilermando Reis,
salta ao rememorar deste rabiscador, um célebre programa que por muitos anos
foi levado ao ar pelas ondas médias da Rádio Emissora de Alagoinhas. Trata-se
de um desfilar de seresteiros da cidade, que em algum dia da semana que este
rememorar não consegue precisar, em maviosas execuções ao violão e, em algumas
ocasiões, com interpretação vocal, enchiam os ouvidos daqueles que acompanhavam
atentos, quer em suas casas, quer no auditório onde o programa se desenrolava.
Este lembrador tem bem nítida a locução de Raimundo Rollemberg,
com sua voz marcantemente impostada e o seu primoroso português, anunciando os
participantes e os números que executariam ou interpretariam. Nomes como os de
Raimundo Espinheira, Diógenes, Wilson Dantas, entre outros, formavam o conjunto
harmônico que fechava a programação da rádio, por volta das 22 horas.
Uma última marca da Rádio Emissora de Alagoinhas que aqui se
quer rememorar, é aquela que talvez tenha sido a mais longeva das apresentações
de programas da transmissão em “ondas médias”. Trata-se do programa “ídolos do
Nordeste”, inicialmente idealizado e apresentado por L Curi – a quem este
escrevedor não chegou a escutar, pois falecera antes de 1970 -, depois
apresentado por Lourival de Andrade – até o seu falecimento ou próximo disto -,
levado a diante por J França e Everaldino Souza, como os seus últimos
apresentadores. Levado ao ar das seis às sete da manhã, fazia desfilar as
músicas entendidas como “nordestinas”, tais como aquelas interpretadas pelos “3
do Nordeste”, Elino Julião, Marinês e sua Gente, “Trio Nordestino”, “Abdias”, “Gerson
Filho”, além daquele que Lourival de Andrade anunciava como sendo “Luiz Lua
Gonzaga”. Também não faltavam as músicas e gracejos do lendário Coronel
Ludugero, cuja presença era indispensável naquela programação, visto encarnar o
“nordestino” típico que povoava o imaginário popular.
AS notas, os abraços e os “alôs” que enviavam para os
diversos ouvintes residentes nas paragens onde a transmissão radiofônica em “ondas
médias” alcançava, fazia o ouvinte do centro e das adjacências saber da
existência dos muitos recantos da urbe alagoinhense: Cangula, Oiteiro, Tucum, Espinho,
além de fazendas, sítios, distritos e outros espaços rurais, para os quais se
imagina que tal programação era dirigida.
Os “reclames” comerciais ficavam por conta do “Armarinho São
João”- tecidos, miudezas e aviamentos em geral -,”Bazar Imperial”, “Café Verde e Amarelo – “Na xícara
cheiroso, na boca saboroso””, ”Café O Barão”, “Mobiliaria Santo Antônio”, “Maru
Cena – o paneleiro da cidade”, “Livraria São Jorge”, “Livraria Lacerda”, “A Nova
Azi – tecidos e confecções -, “Magazine São João”, “Fercam” – eletrodomésticos -,
que rivalizava com a “CMDantas” e a “Fislar”, bem como a “Suprema Móveis” –
tudo para o seu lar -, o “Cine Azi, depois mudado para Capitólio”, com os filmes
que estavam em cartaz, diariamente propagandeado em diversos horários da
programação, entre muitos outros.
Enfim, há ainda alguns “rememorares” que poderiam fazer
parte deste arrazoado. No entanto, já vai um pouco longa esta crônica de um
lembrador contumaz, obrigando-o a abrir outra página mais adiante, com o fito
de deslanchar mais reminiscências daquela rádio que fora única na cidade a
trazer entretenimento e informação para a sua população, até o advento da
Catuense FM, já lá pelos idos dos finais dos oitenta, para os inícios dos anos
noventa, daquele século que viu surgir o rádio como o meio mais versátil de
comunicação social.
Professor José Jorge Andrade Damasceno
FUI OPERADOR DE ÁUDIO NA RÁDIO EMISSORA DE ALAGOINHAS INCLUSIVE DO PROGRAMA ALAGOINHAS EM REVISTA, SE ERRAR ERA BRONCA NA CERTA DO DIRETOR DA RÁDIO NA ÉPOCA KKKKKK
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