sábado, 31 de maio de 2025

AS LINHAS E AS ENTRELINHAS IV


Obras e autores – Parte II.

 

O paciente leitor destes garatujares tem diante de si, mais um conjunto de rememorares que se vem construindo há alguns pares de meses, procurando refletir sobre o que teria levado o personagem analisado, a enfrentar os diversos desafios que lhe foram impostos ou propostos pela vida, nem sempre, em concomitância com as suas escolhas, embora, em algumas circunstâncias e situações, foram aquelas, a razão e o porquê dos diversos embates que precisou enfrentar ao longo do curso da vida. Tais rememorares, se apresentam mediante os fragmentos de lembranças que assomam ao espírito deste escrevedor e, conforme já se tem dito, são trazidas à tona e, dadas a conhecer, depois de se terem feitas as escolhas do que lembrar, do que esquecer e, sobretudo, do que silenciar, inerentes à memória de um ou mais aspectos do passado, lembranças que são acionadas a partir do presente. É, portanto, um rememorar que é fruto do espírito de quem lembra, que, via de regra, intenta compreender aquele passado, à luz de uma confluência entre presente e passado, aquele, evocado em meio às muitas camadas em que está parcialmente submerso; este, já imbuído de elementos vivenciais que foram se impondo e se sobrepondo como mais um feixe de camadas posto sobre aquilo que já foi vivido, mas, que, em razão de se fazer evocar por quem lembra, emerge dentre as muitas camadas que já o recobrem, na forma de representação daquilo que já foi, que acaba por ser ressignificado no presente em que se dá um tal rememorar.

Assim, em consonância com o que se vem desenvolvendo em arrazoados anteriores, talvez se possa articular o postulado segundo o qual, José Mário, no seu processo formativo e escolar, já estivesse sob os efeitos da lenta, gradual mas, constante aplicação do princípio enunciado por José Carlos Libânio e, encontrado nos pressupostos fundamentais da Lei 4024/61 (Lei de diretrizes e Bases da Educação Nacional) e implementado sob os auspícios da Lei 5692/71 (Lei das Diretrizes e Bases para o Ensino do Primeiro e do Segundo Grau), que preconiza um movimento de degradação do ensino oferecido aos alunos admitidos nas escolas  públicas, sobretudo, travestido de democratização do acesso às séries correspondentes aos antigos ginásios e cursos secundários, subsequentes às series iniciais, destinadas a alfabetização das pessoas oriundas das camadas formadas pelos trabalhadores cada vez mais presentes nas grandes, médias e pequenas aglomerações urbanas, acrescido daqueles que se originavam de camadas populares forjadas a partir dos indivíduos procedentes das roças e dos grotões mais distantes e díspares do Brasil. Tal degradação consistia em se oferecer cada vez menos conteúdos propedêuticos correspondentes à série cursada, postergando a aplicação  de ampliação dos graus de dificuldades para as etapas seguintes, deixando para trás aqueles que não conseguissem ultrapassar as etapas de formação, igualmente, penalizando aqueles outros que chegassem nas mais imediatas, porém, sem conseguirem ultrapassar a subsequente, deixando sempre uma lacuna no processo formativo de quem não alcançasse, por alguma razão, o último ponto da caminhada. Ou seja: o que se deveria ser aprendido no primeiro grau, nível 2, ficaria para o segundo grau; o que ali deveria se aprender, seria postergado para o Ensino Superior, no escopo da graduação; e assim por diante.

Portanto, conforme dissera inúmeras vezes o antropólogo Darcy Ribeiro (1922-1997), em entrevistas publicadas nos mais diversos órgãos de imprensa e, em conferências feitas em diversos momentos de sua vida, aquilo não era uma anomalia do sistema; aquilo era o próprio sistema, em seu perfeito funcionamento, conforme fora projetado. À medida em que os filhos dos trabalhadores ganhavam o acesso à escolarização, através de uma significativa ampliação de oferta de vagas nas novas escolas públicas que pareciam promover uma certa “universalização” do acesso à educação gratuita, aquela era tornada cada vez mais precária e enfraquecida em seu rigor, em seus métodos de ensino e de avaliação da aprendizagem, de modo que, salas com quarenta e cinco ou cinquenta alunos; professores ainda em processo de formação para aquele tipo de atuação – visto que, grande parte deles, era egressa do ensino Normal, popularmente conhecido como magistério -, tornava a tarefa de escolarização e de formação futuros “profissionais” cada vez mais limitada ao básico que lhes permitisse um acesso a atividades laborais cada vez mais especializadas, sem que tivessem aquilo que se convencionou denominar de “cultura geral”, que lhes permitisse pensar além da superfície, bem como, compreender aquilo que viesse a ler.

É neste ambiente de escola cada vez mais universal e frágil, que se desenrola o viver cotidiano de José Mário e, que são forjados os seus limites de compreensão do mundo à sua volta. Para além dos seus outros desafios, quais sejam o seu ambiente desfavorável do ponto de vista da aquisição de elementos culturais que lhe permitissem o acúmulo e a troca dos “bens simbólicos”, conforme preconiza o sociólogo francês Pierre Bourdieu (1930-2002), o seu acesso rarefeito a outras leituras, para além daquelas que lhe eram proporcionadas pela distribuição gratuita de livros em Braille, proporcionado pela então Fundação para o Livro do Cego no Brasil, bem como o seu já aludido ingresso tardio no processo de escolarização, ensejou algumas tentativas de apreensão de conteúdos, encontrados em obras com um nível de complexidade tal que, embora ele houvesse conseguido ler toda ela, dali nada retirara, no que tange à compreensão do seu propósito, não obstante se tratar de um autor e de uma temática que ele sequer ouvira falar, nem mesmo de forma aligeirada.

Na altura dos seus dezessete ou dezoito anos, naqueles momentos de interrupções já comentados aqui, que vivera em relação à sétima série do então primeiro grau, José Mário, mesmo possuindo um baixíssimo nível de abstração – se é que possuía algum – arriscara a leitura de Erich Fromm (1900-1980), percorrendo todas as páginas de “Análise do Homem”, a despeito de nada do que fora lido, ter sido compreendido, ainda que minimamente. O precoce leitor, sequer sabia tratar-se de uma obra voltada à psicanálise, com um viés freudiano e, com uma conexão com o pensamento marxista. Aliás, ele sequer sabia da existência de tais pensadores; muito menos, da influência que eles exerceram sobre um grande número de outros que, não só inseriram os seus postulados naquilo que preconizavam, como divulgava por meio das suas reflexões, o pensamento e as premissas teóricas e metodológicas por meio das quais pensavam o homem e a sociedade por ele forjada. Tanto é assim que, uma outra obra de Erich Fromm que lhe caíra nas mãos, não arriscou a leitura, visto não ter quaisquer elementos que o ajudasse no propósito de alcançar uma compreensão dos pressupostos nela contidos – sem falar que a sua leitura era mecânica, conforme já se abordou em outro arrazoado desta série, o que significa, em geral, que o seu propósito era apenas ler, como se fosse um meio de passar o tempo, ocupando-se com alguma atividade.

A obra de Erich Fromm que ele não quisera arriscar a leitura, mesmo que de forma mecânica e visando passar o tempo, era “Medo a Liberdade”. O efeito de uma leitura feita, sem que houvesse qualquer vestígio de compreensão dela, em quaisquer dos seus aspectos, fez com que ele sequer abrisse aquelas páginas para percorrer as suas linhas, considerando-se que, até mesmo uma leitura mecânica tem os seus limites. Tanto é assim que, como poucas vezes o fez, aquelas obras foram passadas adiante e, em conversa com um seu contemporâneo dos tempos de internato, fazendo-lhe saber de sua disposição de assim o fazer, Carlos Castro, aquele seu interlocutor, interessou-se pela oferta e, se dirigiu até o lugar de moradia de José Mário, recebendo dele os ditos volumes de “Análise do Homem” e de  “Medo à liberdade”, que, acreditava, ele tiraria melhor proveito do seu conteúdo.

 

Professor Jorge Damasceno – historiadorbaiano@gmail.com – outono de 2025. 

domingo, 25 de maio de 2025

AS LINHAS E AS ENTRELINHAS III

 

Obras e autores – Parte I.

 

O arrazoado que o paciente leitor ora tem diante de si, é mais um dos muitos frutos que se pode obter através de um exercício de rememoração, exercício este que, conforme já se tem deixado claro,, resulta de um conjunto de escolhas que são feitas por quem lembra, do que lembrar, do que trazer à superfície; do que silenciar ou do que esquecer. Tal exercício feito por quem lembra, permite evocar alguns elementos que se encontram cobertos por muitas camadas de tempo e por muitas camadas de experiências que se sobrepõem ao passado trazido à memória de quem se propõe a lembrar e a escrever sobre aquilo que lembra. Evidentemente que as escolhas do que lembrar e do que esquecer, acabam por sugerir um trabalho do espírito, que traz à lume experiências por ele vividas em um passado mais ou menos distante do presente – ou volta a encobrir com novas camadas de esquecimento ou de silenciamento – abrindo novas possibilidades para outras incursões em outros momentos de lembrares arrancados das sombras de um passado que precisa evocar com ainda mais força e diligência.

Conforme se vem dizendo há algumas páginas, as dificuldades encontradas por José Mário, no tocante à compreensão daquilo que se dispusera a ler, no temo que era construído o seu processo de formação escolar, estava relacionada ao modo como aquele processo era conduzido. Nele não estava presente a construção de um espírito crítico capaz de discernir entre o “dito” e o não “dito”, ao se apropriar de um texto requerido para a elaboração de um trabalho escolar, para uma reflexão a mais simplória ou, ao se valer de uma obra mais completa e complexa para um exame mais aprofundado, afim de fazer mais rico e amplo o seu corolário de elementos constitutivos da vida em agrupamentos humanos, bem como ampliar a sua compreensão daquela sociedade na qual se pretendia inserir e, compreensão que se relacionava com as outras dimensões sociais, políticas, econômicas e culturais, por meio dos quais, pudesse apreender as suas formulações, as suas proposições ou, quiçá, as suas premissas mais fundamentais, para entender os diversos contextos do mundo onde vivia e com o qual precisaria interagir, quer enquanto indivíduo, quer enquanto pertencente a um todo coletivo. No entanto, o que se lhe era dado, consistia pouco mais do que propiciar ao educando a possibilidade de reconhecer os caracteres alfabéticos, fonéticos, silábicos e receber alguns fundamentos gramaticais, que pudesse permitir entrar em contato com o texto a ser lido, apenas em sua conformação aparente e perceptível ao tato – no caso dos leitores por meio do sistema Braille – o que o tornaria um conhecedor apenas superficial do texto ou do conjunto de textos que lhe caísse nas mãos, como se pode concluir, por meio do que até aqui se tem elaborado.

Assim, a abordagem que se pretende desenvolver aqui, diz respeito ao modo como José Mário apresentava uma grande dificuldade em lidar com algumas obras literárias que se lhe foram apresentadas ao espírito. Em primeiro lugar, ele não conseguira estabelecer um nexo entre o que estava diante de si no formato de um livro a ser lido a partir de um ponto de vista ficcional, com o seu cotidiano, tanto no que respeitava ao conjunto dos hábitos e procederes reais do seu ambiente familiar, quanto no que dizia respeito àquilo que se lhe apresentava no ambiente escolar, ou no convívio/contato com amigos, vizinhos, coetâneos ou ainda, moradores do mesmo espaço citadino. Ele se esforçava para se ver “representado” naquelas tramas, vivamente desenvolvidas em grande parte dos livros que lia. Daí, ele ter se deparado com obras que, por não as compreender minimamente em seu intento, acabara por fechar as narrativas sem concluir a apreensão do seu conteúdo. Uma daquelas obras era “Romance de um Moço Pobre”, escrito pelo dramaturgo francês Octavio Feuillit (1821-1890),que recebera em casa, mediante o seu pedido à Fundação para o Livro do Cego No Brasil. O título lhe sugeria um enredo que se aproximasse do seu viver pessoal. Acreditava que o dito romance se pudesse aplicar àquilo que experimentava no seu dia a dia. Mal compreendera as primeiras linhas, ou com um pouco mais de esforço, talvez tenha avançado por mais algumas páginas e, por evidente que não se poderia perceber nelas representado, acabara por deixar a sua leitura de lado, embora, a tenha tentado retomar por mais duas ou talvez, três vezes, sem sucesso.

Em segundo lugar, ele ainda não distinguia os estilos literários – contos, crônicas, romances –, ainda menos , conhecia as distintas fases pelas quais se podia classificar a produção literária – indigenismo, naturalismo, romantismo, realismo e assim por diante. Isto fez com que os livros fossem “devorados” como sendo tudo “romance” – novelas -, principalmente, aqueles que tivessem os finais esperados e desejados pelo leitor. Três obras de Monteiro Lobato (1882-1948) que ele abrira, não conseguira entender e, por isto as fechara sem concluir o percurso pelas suas páginas, dão bem a dimensão daquelas dificuldades. A primeira delas foi “Urupês”, que lhe caiu nas mãos por meio dos catálogos das obras transcritas em Braille que, periodicamente era enviado para os inscritos nos registros de distribuição das obras disponibilizadas pela Fundação para o Livro do Cego NO Brasil. Ao receber a obra em causa, partiu ávido para se apropriar do seu conteúdo. No entanto, as primeiras páginas lhe pareceram por demais obscuras e, logo abandonou a empreitada. Acreditava se tratar de mais um “romance (novela)”, razão pela qual naufragara logo nas primeiras tentativas de viajar naqueles mares imbricados de propósitos – nem sempre subliminares – mas, que para ele, não faziam qualquer sentido! Não sabia tratar-se de um compilado de contos e crônicas do autor, publicado em 1918, que, se tivesse o conhecimento do contexto dos escritos, bem como do que motivara fossem reunidos naquele volume, talvez, quem sabe, pudesse não só ler toda a obra, quanto compreender a sua razão de ser.

A segunda das obras de Lobato que José Mário abrira e não concluíra a sua leitura foi “Cidades Mortas”, que, aliás, nem mesmo o título da obra ele conseguiu entender, do modo como deveria. Para ele, as tais “Cidades Mortas”, de fato seriam mesmo mortas, no sentido mais literal do termo. Outra vez, ele esbarrou na incompreensão do contexto daqueles escritos, por se  tratar de uma coletânea de reflexões sobre as mudanças operadas no Brasil que passava do século XIX para o XX e as implicações econômicas, sociais, políticas e culturais de tal passagem. Outra vez, faltou àquele leitor superficial, as informações que lhe oferecessem o contexto em que foram reunidos os textos ali encontrados, bem como, as informações que lhe permitissem saber se tratar de um estilo literário diferente das novelas que, acreditava, compreendia plenamente o seu desenrolar.

A terceira das obras de Lobato que José Mário não concluiu a leitura, lhe chegara as mãos pela mesma forma que as duas anteriores. Ao pedir que lhe fosse enviada, ele, uma vez mais, acreditara se tratar de um “romance (novela”, embora àquela altura dos seus cerca de quinze, dezesseis ou dezessete anos, a palavra utilizada como título do livro, possuísse para ele uma conotação diferente daquela que apresentava, pois, no meio em que habitava, era uma expressão pejorativa – “nigrinha”, sem registro no dicionário Houaiss da Língua Portuguesa  “, que apresentou para aquele leitor alguma dificuldade de transliteração  para a expressão que dava título ao arrazoado em causa -, que significava uma moça desprovida de respeito – no que tange à moral e aos costumes – de “má fama” ou de conduta social (principalmente, sexual) pouco recomendável. Tratava-se de “Negrinha”, cuja leitura fora interrompida no ponto em que uma menina de sete anos, sofre castigos cruéis por parte de uma senhora, que lhe introduz um ovo quente na boca; que lhe queima a língua com uma colher em brasa. Ali, o leitor desprovido dos elementos que lhe inferissem a contextualização necessária para compreender o enredo, acaba por se decepcionar e interrompe a leitura para não mais a retomar por todo o tempo que durara a sua formação escolar, daquilo que ele acreditava se tratar de uma “história”, ao menos, fosse lúdica, tratando-se de ter sido uma criança tomada como protagonista.

Desta forma, uma vez mais, aquele leitor desprovido de uma compreensão das entrelinhas e, ainda menos capacitado para apreender as muitas subliminaridades embutidas no texto que intentara ler, não sabia tratar-se de um conto – nem mesmo que ali havia outros dois ou três contos coligidos – que pretendia dar a conhecer algumas das maneiras como eram tratadas as pessoas advindas do sistema escravista que vigorara no País até cerca de trinta e dois anos antes de sua publicação. Fosse ele adestrado no processo de ler para além das palavras, compreenderia, por certo, que Lobato empreendia uma crítica à sociedade pós-escravista do início do século XX e, que procurava demonstrar que os principais traços do agir e do pensar social de uma grande parte das elites brasileiras, ainda estavam assentados nos pilares do trabalho escravo, apontando para as atitudes levadas a efeito no trato com as pessoas que foram egressas da escravidão que constituíra a formação econômica e social do Brasil por mais de três séculos, o que indicava uma permanência latente das ideias que se desenvolveram em relação ao elemento negro que conformava aquela sociedade que se queria “moderna”.

 

Alagoinhas – 25 de maio de 2025.

 

Professor Jorge Damasceno – historiadorbaiano@gmail.com 

sábado, 17 de maio de 2025

As linhas e as entrelinhas – II.

 

As leituras eram muitas mas, a compreensão do que lia era rasa –Segunda parte.

 

Conforme o que se escreveu na primeira parte destes garatujares, o processo de escolarização sob o qual José Mário deveria ter sido adestrado para intentar se inserir – ou seria “ser inserido”? – foi concebido e desenvolvido sobre fundamentos rasos e com sedimentação frágil. Também, já se procurou apontar algumas das razões pelas quais assim se implementou o aludido processo, marcado pelo caráter excludente, de uma parte, por questões econômicas e sociais gerais, que permeavam toda a camada formada por trabalhadores temporários, informais e, quando formais, com salários baixos, o que correspondia ao contingente populacional mais preponderante da formação social brasileira e baiana em geral e, claro, alagoinhense em particular, e, de outra parte, pelas circunstâncias inerentes à sua condição sensorial, que, saliente-se de passagem, se fez somar com os demais condicionantes do seu viver pessoal e familiar, o que resultou em uma formação geral insuficiente para que ele pudesse ler – o texto e o seu contexto -, entender o que lia, compreender o que lia, abstrair a essência do que lia, apreender o que lia e, por fim, dar uma interpretação daquilo que lia, tanto para si mesmo, quanto para outrem.

Portanto, por meio do sistema Braille – modo de leitura e de escrita desenvolvido para o uso das pessoas cegas –, José Mário fora ensinado a reconhecer as letras, a identificar as palavras por elas formadas, os períodos, parágrafos e os conjuntos textuais por elas construídos, de modo a fazer dele um leitor voraz. No entanto, ele não fora dotado das ferramentas inerentes ao pensar o que se leu; não teve o espírito forjado para o questionamento do que leu; nem foi dotado das ferramentas que lhe permitissem inferir ou desenvolver sistemas de ilações que lhe dessem algumas pistas da razão de ser daquilo que ele leu. Ainda tomando como exemplo o periódico em Braille que lhe passara pelas mãos, durante todo o tempo que circulou – claro, a partir do momento que a ele chegou o primeiro exemplar, 1972 – a revista “Relevo” que, em geral, trazia matérias publicadas na célebre revista “Realidade” – que aliás, já passava por um filtro para determinar qual das matérias da Realidade seria transcrita em Braille para os leitores cegos; filtro que, ao menos José Mário não sabia existir, muito menos, qual o critério adotado para eleger umas e descartar outras –, não obstante a sua pouca idade quando passou a receber em casa o aludido periódico, diante da ausência de um espírito crítico no seu processo formativo, tais leituras acabavam por ser meramente recreativas ou, como ele dizia, uma forma de fazer passar o tempo que teimava em arrastar-se no seu passo já lento dos seus dias e noites longas e sem grandes variações dos ires e vires dos anos em que a expectativa era a chegada da vida adulta, para poder ingressar no mercado de trabalho. Até lá, eram as leituras, tomadas como passatempo, que lhe permitiam vencer as muitas e longas horas insones que se lhe apresentavam inexoráveis em várias ocasiões do seu caminhar.

É neste sentido que algumas matérias que lera naquelas tardes ou noites do seu cotidiano já pretérito, voltam à sua memória, esmigalhadas pelo alongar dos anos que separam a adolescência do leitor e a sua maturidade. Uma delas já fora mencionada no primeiro arrazoado desta série – aquela que tratava do famoso assalto ao trem pagador inglês –, mais duas poderiam ser aqui evocadas. A primeira delas, tratava daquilo que os redatores de Realidade chamaram de “a Corrida do ouro”. Provavelmente, a matéria se referisse aos contingentes humanos que acorreram em grandes levas, à lugares onde pudessem prospectar “ouro”, de modo a se tornarem ricos – talvez, seja a busca mais insana dos terráqueos (que também pode ter servido de inspiração para a teledramaturgia brasileira, naquele mesmo ano de 1974, claro, em um outro contexto: o do dinheiro) –, quiçá, a matéria apontasse para os casos mais emblemáticos daquele fenômeno social, político e econômico desencadeados nos séculos de ocupação europeia na América. Primeiro, foi a implementada pela colonização luso-hispânica nos primeiros três séculos da ocupação do “Novo Mundo” e, segundo, aquela que foi desencadeada no oeste norte-americano, por volta do século XIX, marcadamente na Califórnia, que resultou, entre outras coisas, naquilo que se convencionou denominar “abertura para o oeste”, até ali, ainda pouquíssimo explorado pelos colonizadores da primeira nação independente do continente. Crê-se não ser de pouca valia ressaltar que, aquele leitor, não dispunha de elementos contextuais para elaborar qualquer das abstrações aqui elencadas.

A segunda das matérias evocadas para sustentar a premissa de que aquele leitor mal entrado na adolescência e, ainda cursando a terceira série do então primeiro grau, portanto, ainda tenro no processo de formação escolar, que apenas lera para passar tempo e, não, para ganhar – ou construir – uma massa crítica que lhe permitisse compreender melhor o mundo que então o cercava, tratava da “primeira crise do petróleo”, desencadeada pelos principais produtores mundiais daquela que era a fonte energética mais importante para a economia mundial de então, o que desencadeou outras crises, como um efeito cascata, que, entre tantas que se poderia mencionar, acabou por provocar uma lenta, porém crescente escassez de vários insumos indispensáveis ao meio cultural, sobretudo, à produção e a circulação de papel – inclusive o papel Braille, cujo fornecimento se dava por meio de importação; o mesmo se deu com o chamado “papel imprensa” – o que levou a  revista “Relevo” a sofrer pequenos atrasos em sua distribuição; depois, evoluindo para atrasos bem mais significativos; até, por fim, encerrar de uma vez a sua produção, circulação e distribuição, deixando grande parte de seus leitores, entre eles, José Mário, sem ter o que ler, nem mesmo para passar o tempo. Sem conseguir atinar como aquela crise energética acabara por interferir na circulação de Relevo; sem compreender como aquele evento econômico interferira, inclusive, na distribuição de papel Braille para o seu uso escolar, ficava claro que ele não só não conseguia atinar e nem compreender, exatamente por não conseguir abstrair do contexto, a incidência daquela crise no seu papel Braille, se, como ele perguntara de si para consigo e, após algumas poucas reflexões, afirmara como resposta – apesar de não possuir completa segurança para tanto -, “o papel não era feito de petróleo”, concluiu peremptório.

Entretanto, o que ele não sabia era que, o processo industrial, que resultava no produto papel – qualquer papel; inclusive, o papel imprensa, como era chamado aquele utilizado para a impressão de jornais, revistas e similares -, estava umbilicalmente ligada àquela matéria prima que, em grande parte da produção industrial, era indispensável para o fornecimento de fontes de energia, sem contar, claro, o transporte do produto final, até os espaços onde ele seria utilizado, inclusive, na escola onde José Mário estudava; no Instituto de Cegos da Bahia onde ele estudaria dali há alguns meses e, na Fundação para o Livro do Cego no Brasil, onde algumas matérias de “Realidade” seriam transcritas e depois, a revista Relevo seria impressa. Assim, como uma das muitas consequências daquela crise desencadeada pelos maiores produtores de petróleo, para forçar não só a elevação dos seus preços mas, também, para trazer as potências bélicas da região à mesa de negociações de paz, a revista Relevo parou definitivamente de circular, o que fez com que fossem reduzidas as possibilidades de José Mário tomar contato com o que ia pelo mundo – mesmo sem o compreender – e, tirara dele o meio que ainda lhe permitia “fazer” o tempo passar.

 

Alagoinhas, 18 de maio de 2025

 

Professor Jorge Damasceno – historiadorbaiano@gmail.com

domingo, 11 de maio de 2025

UM ESCREVEDOR FALA DE MEMÓRIA, CONVICÇÃO E FÉ.

Há quarenta e cinco anos – A TEMPERATURA LÁ FORA ERA FRIA MAS A ALMA SE REGOSIJAVA AO PROFESSAR EM QUEM CRIA.

 

Era um domingo de maio, como este em que ora estes garatujares são escritos; chuvoso e frio e, os interesses estavam voltados para uma comemoração que este escrevente nunca apreciou, embora, por força da liturgia Batista – que mais tarde veio a considerar um resquício do catolicismo focado na veneração mariana, que grande parte do protestantismo acabou por abraçar -, viu-se NELA envolvido, sem qualquer entusiasmo. Afinal, não possuía quaisquer recursos que lhe permitisse comprar um único ramo de flor que fosse para dar à sua mãe; considerando, igualmente, que jamais este tipo de celebração às mães fora incentivado e/ou vivido nos seus primeiros dezenove anos, a não ser as dedicatórias DE MÚSICAS E, ALGUMAS VEZES DE POESIAS ouvidas pelo rádio, sem entender exatamente do que se tratava. Um pouco mais tarde, conheceu a narrativa de que o tal dia fora “criado” por uma jovem Batista norte-americana, que acabou por ser abraçado não só pelos Batistas, bem como por todo o protestantismo – ou quase todo – e, o catolicismo aproveitou para associar a ideia de Maria como “Mãe de Deus”, venerada por todo o mês de maio – o que este escrevedor entendeu se tratar de uma explicação  fundamentada em uma narrativa que, para ele, só servia para justificar aquilo que entendia e, ainda entende, injustificável.

Era novo na fé Batista e, não compreendia muita coisa no que respeitava a liturgias, formas de cultos, o que era "ser" Batista, do ponto de vista dos principais elementos formadores do corpo doutrinal, nem os seus fundamentos filosóficos/teológicos e, por isto mesmo, ainda não considerava haver situações incompatíveis com a fé protestante; afinal, conhecia pouco ou quase nada de “Fé”, fosse ela Batista, fosse Católica, pois, por esta última, passara apenas pela coerção: do batismo como bebê moribundo que não poderia “morrer pagão” e, pela obrigação institucional de realizar a “primeira comunhão” – que aliás, foi a primeira e a única, saliente-se. Mas, naquele onze de maio, a sua ansiedade e a sua expectativa se voltavam para o culto daquela noite. Nele, este que ora rememora uma parte daquele dia, seria imerso nas águas, no batistério daquela que então era a Primeira Igreja Batista de Alagoinhas.

Não fizera roupa especial para a ocasião, por não ter como o fazer; nada fora feito de preparativos para jantar, almoço, sorveteria ou coisas que tais; além de não possuir um ímpeto celebrativo, também não possuía os meios financeiros para tanto. Dirigira-se ao espaço de culto da Primeira Igreja, um lugar simples, aconchegante e, para aquele rapaz, desabituado àquele tipo de ambiente, poderia se classificar como “acolhedor”, onde o frio da noite outonal, somado à temperatura de uma água que já fora ainda mais fria pelo tempo que era preciso para abastecer o batistério, acabara por não ter sido sentido, visto o calor humano e a alegria que contagiara o mais novo arrolado ao seu rol de membros.

Terminada a cerimônia e tendo se dirigido ao seu lugar de moradia, o rapaz pensava de si para consigo, que aquele fora o seu real batismo, por ter se dado de forma consciente e, ele mesmo, de sua própria vontade, se tornara membro daquela Igreja, sem coações, sem se deixar levar pela força de uma tradição que de fato não conseguia nem compreender, nem aceitar. Para ele, a racionalidade daquela cerimônia a que se fez participante, livre e espontaneamente, estaria mais em conformidade com o Evangelho que abraçara, desde janeiro daquele mesmo ano. Quarenta e cinco anos já transcorreram desde aquele distante maio em que se fez uma confissão pública de fé e, aquelas convicções que marcaram a sua volta para casa, ainda persistem firmes, malgrado tudo que se vivenciou dali até o momento presente em que são escritas estas linhas. A memória daquele movimento feito pelo Pastor Jessé Da Silva (In Memoriam), as suas poucas palavras, na condição de “Ministro do Evangelho”, a descida do corpo e o seu erguimento de dentro daquelas águas, ainda persistem vivas no rememorar de quem traceja estas poucas palavras, saído da solidão destes dias em que não se encontra ninguém, para ao menos, falar sobre um tal rememorar.

 

José Jorge Andrade Damasceno  - 11 de maio de 2025

 

Alagoinhas – historiadorbaiano@gmail.com 

domingo, 4 de maio de 2025

As linhas e as entrelinhas – I.

As leituras eram muitas mas, a compreensão do que lia era rasa – Primeira parte.

 

A partir do arrazoado que o arguto leitor ora tem diante de si, este garatujador pretende discorrer sobre um processo que envolveu todo o caminhar formativo de José Mário, tanto enquanto pessoa que se estaria preparando para o “convívio social”, quanto na condição de “cidadão” que deveria ser preparado para ser inserido no contexto da vida econômica, cultural, política e, sobretudo, socialmente ativa. No entanto, saliente-se de passagem – haja visto o que se tem percebido nas atitudes e formas de pensar, tanto dos indivíduos, quanto de diversos grupos deles, pelo menos nos últimos quinze anos  do século XXI (este mesmo da vertiginosa ascensão das quase inumeráveis tecnologias) –, que as fragilidades com as quais José Mário precisou lidar no transcurso dos anos em que ele fora adestrado para aquela tão decantada “vida em sociedade” e , que ao longo dos arrazoados que se pretende construir serão comentados mais amiúde, não lhe dizia respeito apenas a si, enquanto um dos elementos sobre os quais eram incutidos os fundamentos teóricos e metodológicos inerentes àquele tipo de “ajuste” ao “viver coletivo”. Com o passar dos anos, ficou claro que havia um projeto de construção de “cidadãos” cordatos, acríticos, politicamente apáticos e prontos para serem levados para onde soprassem os ventos impulsionados pelos meios de comunicação. Um enfraquecimento dos sistemas de ensino era sentido nitidamente, mas, camuflado sob diversas camadas de ideais elitistas difundidos, e infundidos por meio dos muitos instrumentos sociais e pelas eficazes ferramentas comunicacionais, encobrindo os reais objetivos de sua implementação. O fracasso observado nos processos de ensino cada vez mais acessíveis às camadas inferiores da formação social brasileira, paradoxalmente à expansão de sua abrangência a todo o território nacional, bem como a abertura da escola para receber em seu bojo os filhos dos trabalhadores e, por meio do “Mobral”, até mesmo os seus pais, diriam Darcy Ribeiro (1922-1997) e José Carlos Libânio (1945-), não era se não um projeto bem sucedido, pensado e executado em favor das elites que diziam ser sua a iniciativa de “alfabetizar” a população. Não se dizia porém, que aquele “alfabetizar”, tanto possuía um limite, como deveria atender a objetivos bem definidos por aquela elite, que, evidentemente, não estava claro para grande parte dos executores, muito menos, para aqueles aos quais se destinava a iniciativa de se reduzir os índices de analfabetismo em todos os rincões do Brasil, que era movido sob a batuta dos Generais/presidentes, coadjuvados pelos seus fiéis “cães-de-guarda”.

Portanto, a formação escolar daquele aluno que em sua maioria, com muito esforço e resignação logrou concluir a sua formação básica, apresenta grande lacuna estrutural, visto não o ter dotado de ferramental que ele possa instrumentalizar os processos de codificação e congruente decodificação, para que a mensagem não seja apenas lida mas, sim, seja percebida e compreendida na sua inteireza. Aquele aluno, desta forma, experimenta algumas dificuldades de compreensão dos textos que leu – ou lê – que por força da obrigação das tarefas escolares, quer por força de um hábito salutar que acabou por adquirir, malgrado o pouco ou nenhum estímulo recebido; apesar dos custos para aquisição de títulos, ou para a aceder aos lugares onde possa encontrar livros e/ou periódicos que lhe atenda a tal necessidade e/ou desejo, inclusive e sobretudo, durante o tempo de escolarização. É assim que, contrariando um dos elementos chave da premissa propugnada pela teoria da comunicação, se ergue uma barreira entre o “comunicador” e o “comunicando”, se interpondo entre ambos uma nuvem que acaba por dificultar por sua opacidade, a compreensão da mensagem comunicada, erguendo um hiato entre o que é escrito pelo emissor de uma mensagem dada e, o leitor, que, embora reconheça o conjunto das palavras que compõem aquela mensagem que lhe foi dirigida, havendo, entretanto, uma interrupção na compreensão da mensagem lida.

Tomando-se o caso de José Mário – que, como se salientou, não estava sozinho naquele navegar social nas águas turvas e tormentosas marés brasileiras das décadas que sucederam ao Golpe Militar de 1960 – e, como foi apontado há algumas postagens, quando se procurou desenvolver algumas digressões sobre “uns tempos idos”, ele refletia bem aquilo que foi esboçado há algumas linhas. Foi dito na primeira das “Seis Digressões”, publicada no início deste ano em curso, que “[...], José Mário possuía um elevado grau de dificuldade para ir além da superfície da compreensão de texto, pois, apesar de ler algumas das excelentes matérias publicadas pela revista Realidade – aquelas transcritas na revista Relevo (em Braille) -, não conseguia ir muito além do “significado das palavras”. A profundidade daquelas matérias era quase que impenetrável para ele”. Portanto, aquele leitor voraz, reconhecia plenamente as palavras; mas, não conseguia estabelecer os nexos entre elas e o discurso que as impregnava. Não é demais ressaltar que  José Mário fora apresentado à leitura, na precocidade dos seus onze anos completados em finais de 1971. Também cabe lembrar, de passagem, que, àquela altura, quando deveria já ter ingressado na quinta série, ele ainda se encontrava no terceiro ano do nível 1, do primeiro grau – equivalente ao fundamental 1 –, o que diz muito sobre o descompasso entre a idade cronológica e a idade escolar, que fizera parte de toda a sua trajetória. Malgrado aquele descompasso, a sua idade cronológica já seria suficiente para compreender melhor a mensagem recebida em forma de texto: obviamente, se dispusesse dos códices sociais e culturais que lhe inferisse os elementos que lhe permitisse uma decodificação dos escritos que lhe passaram sob os dedos. Ao contrário do que era esperado, a sua leitura não era capaz de ultrapassar os signos silábicos e os construtos fonéticos, malgrado o material que lhe houvesse passado pelas mãos, exibissem algum rigor literário.

Por exemplo, ele leu uma reportagem transcrita da revista Realidade, que falava sobre o “Assalto ao Trem Pagador”, impressa em Braille pela Fundação Para o Livro do Cego no Brasil, em sua revista Relevo e, o máximo que ele reteve e absorveu com alguma destreza, repousou na ousadia e no planejamento da ação dos executores da façanha. No entanto, o discurso embutido naquele texto – como por exemplo a motivação da ação dos ladrões e, sobretudo, a motivação daquela reportagem de Realidade ser a escolhida para a transcrição em Relevo, em detrimento de alguma outra matéria daquela prestigiada revista (embora, ele nada soubesse sobre ela, naquela ocasião) – ele sequer atinou. Contentou-se em fazer uma leitura acrítica e rasa, limitando-se a uma espécie de  “torpor” por ter tido acesso a um texto que outros brasileiros, que enxergam, também tiveram.

Também se ressaltou na aludida postagem de janeiro deste ano, que “A sua formação escolar era quase sem livros, pois eles lhes eram inacessíveis, sobretudo, em transcrição Braille, embora [...]” o seu acesso à produção “[...] literária fosse mais ampla, pela mesma razão inversa, isto é, havia uma” transcrição “e uma distribuição de livros em Braille, que abrangia as diversas criações literárias, sobretudo, aquelas do século XIX”, que ele tateou com avidez, não obstante aquela avalanche de livros lidos, não ter sido suficiente para formar nele um espírito crítico, pronto para inferir e abstrair os elementos mais fundamentais contidos nas excelentes obras que passaram por suas mãos. Ainda conforme se aludiu na referida postagem pretérita, ao que parece, se formou um grande fosso entre o volume de obras lidas e os níveis de compreensão delas, por parte de quem as leu. Assim:

“Malgrado o acesso a um largo número de obras e autores e, a voracidade com que ele percorria as páginas e as partes em que eram divididos os livros em Braille que lhe caíam nas mãos, aquela leitura era superficial, mecânica, emotiva e, quase sempre, acrítica, pouco ou nada reflexiva, o que significava não alcançar o objetivo esperado pelo contato com tão vasta e diversificada gama de autores e o seu modo de pensar, no que tange à construção de uma percepção e à uma leitura do mundo que o cercava”.

Portanto, ao contrário daquilo que era de se esperar de tal afinco em percorrer as muitas obras que lera durante mais ou menos treze anos, é possível assegurar que não houve uma sincronia entre o lido e o compreendido. Este foi o tempo que durou a grande expansão observada na transcrição e na  distribuição de ogras em braile,  que teve como maior propulsora, a Fundação para o Livro do Cego no Brasil,. Tal movimento se poderia situar entre 1960 e 1990 e, que teve o seu ímpeto enfraquecido, a partir da segunda metade da década de 1970, entre outras razões, por conta das duas crises do petróleo, acarretando, em cadeia, uma forte alta nos preços do papel – atingindo em cheio a produção do livro em Braille.

 

Alagoinhas – 04 de maio de 2025

 

José Jorge Andrade Damasceno – historiadorbaiano@gmail.com